STJ analisa a possibilidade de cumulação de cláusula penal e lucros cessantes nos contratos imobiliários

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Em maio do ano passado, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça entendeu afetar os Recursos Especiais de n.º 1.635.428 e 1.498.484 a serem julgados pelo rito dos recursos repetitivos (artigo 1.036 do Código de Processo Civil), em que se discutia a possibilidade ou não de cumulação de pedidos de pagamento de valores oriundos de cláusula penal constante de contrato de promessa de compra e venda de unidade imobiliária na planta e condenação em lucros cessantes na mesma ação, e os quais ficaram sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão.

Diante da relevância da matéria e, nas palavras do Eminente Ministro, “em vista da patente transcendência social, econômica, e jurídica do precedente que virá a ser firmado”, este determinou a realização de uma Audiência Pública para discussão não só do tema exposto acima, mas também, e por ter correlação com este, os processos afetados onde se discute a possibilidade ou não de inversão, em desfavor da construtora (fornecedor), da cláusula penal estipulada exclusivamente para o adquirente (consumidor), nos caso de inadimplemento em virtude de atraso na entrega de imóvel objeto de contrato ou promessa de compra e venda (REsp 1.614.721/DF e REsp 1.631.485/DF).

Ao final da última década, o mercado imobiliário viveu um período de grande movimentação, com o lançamento de inúmeros empreendimentos imobiliários em diversos segmentos e padrões.

O crédito farto e a grande oferta de imóveis fizeram com que muitas pessoas considerassem as condições favoráveis para, enfim, realizar o sonho da casa própria, adquirindo seu imóvel “na planta” junto às construtoras.

Entretanto, e baseado em diversos fatores que vão desde prazos inexequíveis para entrega das unidades imobiliárias até a inegável crise econômica que acabou por assolar o mercado da construção civil no país, viu-se o crescimento exponencial de ações envolvendo os adquirentes e as construtoras, muitas delas motivadas pelo atraso na entrega das unidades imobiliárias.

Nestas ações, invariavelmente o adquirente que não recebia sua unidade imobiliária requeria, entre outros pedidos, a incidência da multa contratual pelo descumprimento do prazo de entrega da unidade imobiliária e o pagamento de verba indenizatória consubstanciada nos lucros cessantes porventura observados no caso concreto, provocados igualmente pelo atraso na conclusão e entrega do empreendimento.

E, a partir destes pedidos, verificou-se a questão proposta neste artigo: haveria possibilidade de, em havendo multa estipulada nos contratos em caso de atraso na entrega de unidade imobiliária, esta ser cumulada com eventual indenização por lucros cessantes oriunda deste mesmo atraso?

Assim, diante do crescente número de ações que continham tais pedidos cumulados, e igualmente da diversidade de decisões que julgavam o tema, finalmente a matéria chegou ao Superior Tribunal de Justiça para análise.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça afetour os Recursos Especiais de n.º 1.635.428 e 1.498.484 a serem julgados pelo rito dos recursos repetitivos (artigo 1.036 do Código de Processo Civil). O tema foi cadastrado sob o n.º 970 no sistema de recursos repetitivos, e que recebeu a seguinte redação: “Definir acerca da possibilidade ou não de cumulação da indenização por lucros cessantes com a cláusula penal, nos casos de inadimplemento do vendedor em virtude do atraso na entrega de imóvel em construção objeto de contrato ou promessa de compra e venda.”

O Ministro Luis Felipe Salomão, a quem coube a relatoria dos Recursos Especiais, ainda determinou a suspensão de todas as ações em território nacional que versem sobre a matéria, suspensão esta que não impede o ingresso com novas ações sobre o tema, ou mesmo a celebração de acordos entre os litigantes.

Quanto ao tema aqui proposto, e que foi objeto de afetação através do REsp 1.635.428, o Tribunal de Justiça o Estado de Santa Catarina, ao julgar processo de um adquirente em face de uma construtora, entendeu não ser possível a cumulação de pedido de cobrança da multa existente na cláusula penal por atraso na entrega da unidade imobiliária com a indenização por lucros cessantes.

Em suas razões, o Eminente Desembargador Luiz Cesar Medeiros entendeu que a cláusula penal contratualmente prevista e a indenização por perdas e danos não poderiam ser cumuláveis eis que possuem a mesma natureza.  Na visão do TJSC, “a cumulação é permitida somente em que prevista na avença, de sorte que a indenização é, assim, suplementar, isto é, somente haverá condenação a perdas e danos sobre aquilo que sobejar o montante da cláusula penal.”

Por sua vez, o adquirente suscitou precedentes do próprio Superior Tribunal de Justiça, sustentando que “a multa prevista pela cláusula penal não deve ser confundida com a indenização por perdas e danos pela fruição do imóvel, mormente quando há desproporção entre os valores contratualmente previstos e o efetivo prejuízo experimentado[1].

Dada a importância do tema afetado, da sua complexidade e do impacto social que este terá, tendo em vista a enorme quantidade de ações que encontram-se suspensas e que versam sobre a questão, o Ministro Luis Felipe Salomão determinou a realização da audiência pública prevista no artigo 185 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça para fixação da tese repetitiva[2].

Na audiência pública realizada no último dia 27, 13 juristas representando tanto os consumidores como as construtoras puderam expor suas teses e pontos de vista acerca da matéria. Entre as ideias por eles difundidas, pode-se destacar a fala do Defensor Público da União, Dr. Antônio Maia de Paula, que salientou que o atraso na entrega da unidade leva o consumidor a tomar decisões que não lhe são favoráveis.  Posição na qual foi acompanhado pelo representante da ANADEP  (Associação Nacional das Defensoras e dos Defensores Públicos), que destacou também a hipossuficiência dos adquirentes, pugnando pela manutenção do entendimento que hoje é adotado pelo Superior Tribunal de Justiça. Por outro lado, o risco de a possibilidade de cumulação dos pedidos poderia configurar um verdadeiro bis in idem ao consumidor, como sustentou o Professor Silvio Capanema de Souza, em nome da Câmara Brasileira da Industria e Comércio (CBIC). Participaram ainda dos debates os economistas Gustavo Franco e Eduardo Zylbertajn, da FGV, além de representantes da OAB/PA e OAB/GO e de entidades como Sinduscon/SP e Secovi/SP.

Assim, caberá ao Ministro Salomão decidir acerca da matéria, proferindo acórdão que será adotado por todos os julgadores e determinará o resultado de todas as ações suspensas que versem sobre a matéria, pacificando a jurisprudência sobre o tema afetado.

 

[1] REsp 1.545.936/SC

[2] Art. 185. Serão públicas as audiências: I – do Presidente ou do relator para ouvir pessoas ou entidades com experiência e conhecimento em matéria de interesse para a fixação ou alteração de tese repetitiva ou de enunciado de súmula;

 


A Lei Geral de Proteção de Dados e o impacto nas relações dos fornecedores com os consumidores

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Foi publicado no Diário Oficial da União o texto integral da nova Lei Geral de Proteção de Dados (Lei Federal n.º 13.709/18), sancionada pelo Presidente Michel Temer, e que vem a regulamentar o uso dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou jurídica de direito público ou privado, com vistas a garantir os Direitos Fundamentais de Liberdade, Privacidade e Livre Desenvolvimento da Personalidade da Pessoa Natural.

Com isso, ficarão submetidos ao que dispõe a Lei toda e qualquer operação de dados pessoais realizado por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, independentemente do meio, do país de sua sede ou do país onde estejam localizados os dados, desde que a operação de tratamento seja realizada em território nacional; a atividade de tratamento tenha por objetivo a oferta ou o fornecimento de bens e serviços ou o tratamento de dados de indivíduos localizados no território nacional; e os dados pessoais tenham sido coletados em território nacional.

A necessidade de regulamentar a crescente circulação de dados pessoais trazida – embora a Lei não tenha sua aplicação restrita a estes meios – pelos meios eletrônicos e a necessidade de dar aos titulares destes dados não só a ciência, mas o poder de decisão de como e quando os dados poderão ser utilizados, modificados, ou até mesmo, excluídos são os principais motivos para a promulgação da legislação sobre o tema.

Vale ressaltar que a União Europeia, da mesma forma, aprovou o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (General Data Protection Regulation), que serviu como base para a conclusão da Lei brasileira, e que começou a ser idealizado ainda no início da década com a finalidade de instituir regras rígidas a qualquer um (pouco importando se grande ou pequena empresa, ou mesmo pessoa natural) que desejasse coletar, compartilhar ou mesmo guardar dados pessoais.

Com isso, empresas brasileiras que tinham atividades ligadas a países da União Europeia já tiveram que fazer adaptações na forma como coletavam, armazenavam e utilizavam os dados de seus clientes e fornecedores.

A Lei 13.709/18 define, para efeitos do seu cumprimento, dado pessoal como a informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável, e tratamento como toda operação realizada com dados pessoais, como as que se referem a coleta, produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação, transferência, difusão ou extração de dados pessoais, seja de que meio for.

É necessário observar que o tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas hipóteses trazidas pela lei em seu artigo 7º. São elas:

I – mediante o fornecimento de consentimento pelo titular;

II – para o cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador;

III – pela administração pública, para o tratamento e uso compartilhado de dados necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos, convênios ou instrumentos congêneres, observadas as disposições do Capítulo IV desta Lei;

IV – para a realização de estudos por órgão de pesquisa, garantida, sempre que possível, a anonimização dos dados pessoais;

V – quando necessário para a execução de contrato ou de procedimentos preliminares relacionados a contrato do qual seja parte o titular, a pedido do titular dos dados;

VI – para o exercício regular de direitos em processo judicial, administrativo ou arbitral, esse último nos termosda Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 (Lei de Arbitragem);

VII – para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro;

VIII – para a tutela da saúde, em procedimento realizado por profissionais da área da saúde ou por entidades sanitárias;

IX – quando necessário para atender aos interesses legítimos do controlador ou de terceiro, exceto no caso de prevalecerem direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais; ou

X – para a proteção do crédito, inclusive quanto ao disposto na legislação pertinente.

O tratamento das informações pessoais verificar-se-á quando a finalidade da captação dos dados for alcançada ou de que os dados deixaram de ser necessários ou pertinentes ao alcance da finalidade específica almejada, ou, ainda, quando ocorrer o fim do período de tratamento dos dados, ocorrer a comunicação do titular dos dados, e por determinação da autoridade nacional, quando houver violação ao disposto na Lei.

Vale destacar que a não observância dos preceitos legais trazidos pela Lei 13.709/18 poderá acarretar, entre outras sanções, em multa simples, de até 2% (dois por cento) do faturamento da pessoa jurídica de direito privado, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, limitadas ao total de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) por infração ou, ainda, multas diárias, observando-se o mesmo limite.

A publicação ocorreu em 15 de agosto de 2018, mas a vigência da nova Lei dar-se-á apenas em 18 (dezoito) meses, inclusive possibilitando que todos se adequem aos seus termos.

Com isso, será necessário que todos observem a nova disciplina sobre o tratamento de dados no Brasil, devendo, inclusive, as empresas investir em treinamento daqueles que diretamente trabalharão nesta função, tendo em vista que passarão a integrar o rol de fatores que poderia ensejar sua responsabilização pelo mal uso dos dados pessoais e, consequentemente, incorrer em severos prejuízos.


Agravo de Instrumento: Mitigação da Taxatividade do Rol previsto no artigo 1.015 do Código de Processo Civil

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Durante anos, os operadores do direito, em especial os advogados militantes nos processos cíveis, acostumaram-se com a possibilidade de recorrer das decisões interlocutórias proferidas durante a fase de conhecimento dos processos cíveis através da interposição de Agravos, retidos ou de instrumento.

E tal questão sempre trouxe uma conexão, em muitas vezes até equivocada, com o tempo de tramitação dos processos cíveis nos Tribunais de todo o Brasil. Sabe-se que um processo judicial pode arrastar-se por anos e anos perante os Tribunais, estando a parte e o advogado sujeitos a uma gama de acontecimentos durante sua tramitação. E, em muitos casos, esta demora era creditada a previsão legal de interposição de inúmeros recursos durante a tramitação do processo, alguns deles dotados de efeito suspensivo, e que “atrasavam” a resolução do conflito ali materializado.

Poder-se-ia aqui citar um sem número de fatores que contribuíam – e ainda contribuem – para que um processo judicial literalmente se arraste, mas os recursos nunca deixaram a pecha de grandes vilões da celeridade processual.

Antes mesmo da entrada em vigor da Lei Federal 13.105/2015 (Novo Código Civil), houve mudanças na sistemática dos Agravos como, por exemplo, aquelas instituídas pela Lei Federal  11.187/2005 que, à título de ilustração, transformou o Agravo Retido na “regra”, limitando os casos de interposição do Agravo na modalidade de instrumento aos casos em que a decisão recorrida estivesse suscetível de trazer à parte lesão grave ou de difícil reparação[1], assim como nos casos de inadmissão de Apelação ou quantos aos efeitos nos quais esta era recebida.

A rigor, a mudança acima representava uma evolução para aqueles que defendiam que os recursos obstavam o andamento do processo, uma vez que a interposição do Agravo na modalidade Retido não suspendia a tramitação do feito, mas, ao ser reiterado como preliminar de eventual Apelação interposta pela parte, seria conhecido e julgado pelo Tribunal de Justiça por ocasião da apreciação do apelo.

Entretanto, a Lei deixava ainda certa subjetividade quanto ao cabimento do Agravo de Instrumento, uma vez que não trazia, em seu bojo, quais as situações em que a decisão poderia, em tese, gerar à parte perigo de lesão grave e de difícil reparação. Assim, bastaria ao competente advogado alegar e sustentar a possibilidade de lesão grave a justificar a interposição do Agravo de Instrumento de qualquer decisão interlocutória na fase de conhecimento.

Com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (Lei Federal 13.105/2015), uma das mudanças mais relevantes e que mereceu inúmeros comentários e estudos foi justamente a inserção de um rol das hipóteses de cabimento do Agravo de Instrumento quanto às decisões interlocutórias proferidas ao longo da fase de conhecimento.

O artigo 1.015 do Código de Processo Civil trazia o que muitos juristas afirmavam ser um rol taxativo das hipóteses de cabimento do Agravo de Instrumento. Em se classificando como taxativo, por certo o rol não comportava outras opções além daquelas ali expostas, e também daquelas em que a Lei expressamente admitisse o cabimento do Agravo de Instrumento.

De ressaltar também que o novel Código de Processo Civil acabou com a figura do Agravo Retido, mantendo-se, entretanto, uma de suas peculiaridades, consubstanciada na necessidade de se reiterar em preliminar de apelação (e de contra-razões à apelação) todas as matérias objeto de decisões interlocutórias proferidas no processo de conhecimento e que não encontravam previsão de serem atacadas por Agravo de Instrumento – ante a então taxatividade do rol contido no artigo 1.015 – conforme preceitua o artigo 1009, § 1º, do CPC[2].

Desta forma, a mudança foi exaltada por aqueles que defendiam uma redução drástica nas oportunidades de interposição de recursos pelas partes durante a tramitação do processo.

Entretanto, a sistemática exposta no Código de Processo Civil também se viu diante de um problema: ao adiar a análise de eventual indignação quanto à uma decisão interlocutória para a fase recursal, poder-se-ia, ao contrário do que imaginavam os entusiastas do novo modelo, inutilizar diversos atos processuais, que poderiam vir a se tornar nulos ou imprestáveis no caso do acolhimento das razões em preliminar de apelação.

Igualmente, poderia haver situação em que houvesse a necessidade de um imediato provimento jurisdicional a fim de se evitar situação de perigo que não esteja abrangida pelo rol do artigo 1.015 do Código de Processo Civil. Neste cenário, advogados de diversos estados defendiam que o rol constante no artigo anteriormente citado não era, em verdade, um rol taxativo, pois haveria que ser considerada hipótese não contida ali a fim de promover a melhor solução – e diversos sentidos – para questões cujo tratamento apenas em grau de Apelação poderiam ser inócuas ou já poderiam ter causado situação de prejuízo às partes.

A questão chegou ao Superior Tribunal de Justiça. Através do Tema 988, a Corte iria decidir sobre a admissão de Agravos de Instrumentos interpostos em hipóteses não previstas pelo Código de Processo Civil, mantendo ou mitigando a taxatividade do rol previsto no artigo 1015.

Coube à Ministra Nancy Andrigui a relatoria dos Recursos Especiais afetados (RESp 1.704.520 e 1.696.396 – para julgamento pelo sistema dos recursos repetitivos.

Em 01 de Agosto do Corrente ano, a Ministra proferiu seu voto no sentido de mitigar a taxatividade do rol existente no artigo 1.015 do Código de Processo Civil.

Destaca-se alguns trechos do voto da Exma. Ministra Nancy Andrigui, que elucidam a conclusão por ela tomada no julgamento. São eles:

“Como se percebe, o entendimento aqui exposto pretende, inicialmente, afastar a taxatividade decorrente da interpretação restritiva do rol previsto no art. 1.015 do CPC, porque é incapaz de tutelar adequadamente todas as questões em que pronunciamentos judiciais poderão causar sérios prejuízos e que, por isso, deverão ser imediatamente reexaminadas pelo 2º grau de jurisdição.

De igual modo, deve ser afastada a possibilidade de interpretação extensiva ou analógica das hipóteses listadas no art. 1.015 do CPC, pois, além de não haver parâmetro minimamente seguro e isonômico quanto aos limites que deverão ser observados na interpretação de cada conceito, texto ou palavra, o uso dessas técnicas hermenêuticas também não será suficiente para abarcar 38 todas as situações em que a questão deverá ser reexaminada de imediato – o exemplo do indeferimento do segredo de justiça é a prova cabal desse fato.

Finalmente, também não deve ser acolhido o entendimento de que o rol do art. 1.015 do CPC é meramente exemplificativo, pois essa interpretação conduziria à repristinação do art. 522, caput, do CPC/73, contrariando frontalmente o desejo manifestado pelo legislador de restringir o cabimento do recurso, o que não se pode admitir.

A tese que se propõe consiste em, a partir de um requisito objetivo – a urgência que decorre da inutilidade futura do julgamento do recurso diferido da apelação –, possibilitar a recorribilidade imediata de decisões interlocutórias fora da lista do art. 1.015 do CPC, sempre em caráter excepcional e desde que preenchido o requisito urgência, independentemente do uso da interpretação extensiva ou analógica dos incisos do art. 1.015 do CPC, porque, como demonstrado, nem mesmo essas técnicas hermenêuticas são suficientes para abarcar todas as situações.”


Forte nessas razões, CONHEÇO o recurso especial repetitivo, a fim de:

1. Fixar a seguinte tese jurídica: O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação.

2.Modular os efeitos da tese jurídica:A tese jurídica somente se aplicará às decisões interlocutórias proferidas após a publicação do presente acórdão.”

Desta forma, a Ministra mitigou a taxatividade do rol constante do artigo 1.015 do Código de Processo Civil em seu voto, estando o julgamento dos recursos afetados suspenso por motivo de pedido de vista da Exma. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

Deve-se destacar que o próprio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro já havia se manifestado pontualmente sobre o tema, sem a abrangência lógica do julgamento em andamento perante o Superior Tribunal de Justiça, no sentido de desconsiderar a taxatividade do rol constante do artigo 1.015 do Código de Processo Civil, como se pode verificar do julgamento dos Agravos de Instrumento n.º 0050535-69.2016.8.19.0000 e n.º 0025809-60.2018.8.19.0000.

Nos parece acertada a posição adotada pela Ministra Nancy Andrigui, em consonância como a dos Desembargadores do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro nos processos acima citados, uma vez que, ao que parece, o simples impedimento de manejo do Agravo de Instrumento não pode ser a única forma de dar celeridade ao processo. Ao contrário, o recurso deve ser permitido em todas as situações em que se observe um requisito objetivo: a urgência que decorre da inutilidade futura do julgamento do recurso diferido da apelação – impedindo o engessamento das hipóteses legais de cabimento do Agravo de Instrumento contidas no artigo 1.015 do Código de Processo Civil.

 

[1] Art. 522. Das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação é recebida, quando será admitida a sua interposição por instrumento.        (Redação dada pela Lei nº 11.187, de 2005)

[2] Art. 1.009.  Da sentença cabe apelação.

§ 1As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.

§ 2Se as questões referidas no § 1forem suscitadas em contrarrazões, o recorrente será intimado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se a respeito delas.

 


Administrador de empresa que não observar o Dever de Informar poderá responder por danos a sócios e a terceiros

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Tramita perante a Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n.º 8.657/2017, de autoria do Dep. Carlos Bezerra, que visa instituir importantes mudanças na atual legislação que rege as Sociedades Anônimas, notadamente quanto à possibilidade de se atribuir responsabilidade ao administrador por falha ou violação do Dever de Informar.

O PL 8.657/2017 visa alterar os artigos 157 e 158 da Lei Federal n.º 6.404/76, que “dispõe sobre a Sociedade por Ações, para fins de disciplinar a responsabilidade civil e o dever de informar dos administradores das companhias”.

Em uma primeira leitura da ementa transcrita acima, tem-se a impressão que o novo Projeto de Lei trará inovação quanto à inserção, na Lei já existente, do Dever de Informar por parte do Administrador e de eventual responsabilidade civil em caso de inobservância.

Devemos alertar que tal dever já existe e encontra-se previsto em lei, juntamente com outros dois deveres do administrador: o Dever de Diligência e o Dever de Lealdade.

A legislação em vigor já disciplina o Dever de Informar e a obrigatoriedade do administrador em observá-lo, mas apenas em relação a Comissão de Valores Mobiliários e às bolsas de valores ou entidades de mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação[1].

Em verdade, o Projeto de Lei visa, como o seu próprio texto expressamente cita, “estender ao público em geral as informações relacionadas aos fatos relevantes e reputados como verdadeiros relacionados à companhia, em sua inteireza, de forma consistente, tempestiva e atualizada, sempre zelando pela utilização de linguagem clara, objetiva e consisa[2]

Igualmente, a responsabilização do administrador não constitui inovação por parte do PL 8.657/2017.

O artigo 158 da Lei Federal 6.404/76 prevê que o administrador responde civilmente pelos prejuízos que causar quando proceder com culpa e dolo dentro de suas atribuições ou poderes, ou ainda quando seu atuar se dá com violação à lei ou ao estatuto da sociedade por ações.

Entretanto, e por força da primeira alteração da qual já tecemos comentários, viu o legislador a necessidade de se atribuir expressamente a responsabilidade civil do administrador também pelos dados causados aos sócios e a terceiros.

Muito embora entendamos que tal inserção extirpe quaisquer dúvidas quanto a possibilidade de atribuição de responsabilidade civil do administrador  por danos causados por sua culpa ou dolo a sócios e terceiros, da mesma forma acreditamos que a violação ao Dever de Informação poderia, desde já, ensejar a responsabilidade civil do administrador pela regra geral existente no próprio Código Civil em seu artigo 927[3], devendo haver prova do cometimento do ato ilícito por parte do administrador, através de ação ou omissão, e que tal ato tenha gerado efetivo prejuízo.

Deve-se lembrar que, mesmo vindo a ser aprovado o Projeto de Lei acima citado, a regra continua a de que o administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair em nome da sociedade em virtude do ato regular de gestão; apenas quando agir com dolo ou culpa, ou em violação à lei e ao estatuto, poderá o administrador ser responsabilizado.

Entretanto, se aprovado o PL tal como proposto, trará importante positivação na legislação sobre o tema, realçando ainda mais a necessária observância do Dever de Informar pelo administrador e, principalmente, das consequências de sua atuação, não só em relação aos órgãos que regulam o setor, mas também aos acionistas e a terceiros, evitando-se situações oriundas das decisões da companhia prejudiciais não só quanto ao contexto econômico, mas também na questão social, ambiental, consumerista, trabalhista, entre outras, primando sempre pela clareza, lisura e transparência, em estrita observância à Lei e ao estatuto, aspectos dos quais o Administrador não poder jamais alijar-se.

 

[1] Lei 6.404/76, artigo 157, § 6º: “Os administradores da companhia aberta deverão informar imediatamente, nos termos e na forma determinados pela Comissão de Valores Mobiliários, a esta e às bolsas de valores ou entidades do mercado de balcão organizado nas quais os valores mobiliários de emissão da companhia estejam admitidos à negociação, as modificações em suas posições acionárias na companhia”. (Incluído pela Lei nº 10.303, de 2001)

[2] PL 8657/2017 – “II – ao público em geral, notadamente ao mercado em que atua, por intermédio de portal na rede mundial de computadores (internet), todos os fatos relevantes e reputados como verdadeiros relacionados com a companhia, em sua inteireza, de forma consistente, tempestiva e atualizada, sempre zelando pela utilização de linguagem clara, objetiva e concisa”

[3] Código Civil – Art. 927. Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, é obrigado a repará-lo”


Responsabilidade dos Sócios à luz da Reforma Trabalhista

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Dentre as principais preocupações na constituição de uma empresa destacam-se, inegavelmente, os riscos e responsabilidades assumidos pelos sócios, seja durante o exercício de suas atividades ou mesmo após sua saída do quadro societário.

Via de regra, os sócios não respondem com seu patrimônio pessoal pelas dívidas da pessoa jurídica, uma vez que as personalidades jurídicas são distintas e não se confundem. Todavia, havendo abuso da personalidade jurídica, consubstanciado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento, que os efeitos de certas e determinadas relações obrigacionais sejam estendidos aos bens particulares dos sócios e/ou administradores da pessoa jurídica, conforme preleciona o artigo 50 do Código Civil.

A chamada desconsideração da personalidade jurídica é, portanto, medida excepcional, somente tendo lugar quando comprovada a ocorrência de fraude ou abuso de direito, na forma da lei. Há, contudo, duas teorias de aplicação da mesma.

Isso porque, para além do que estabelece o Código Civil, há o Código de Defesa do Consumidor, que adota teoria distinta para justificar a desconsideração da personalidade jurídica. Enquanto o primeiro acolheu a teoria maior, exigindo a demonstração de abuso ou fraude como pressuposto para sua decretação (artigo 50, CC), o CDC perfilha a teoria menor, a qual admite a responsabilização dos sócios quando a personalidade da sociedade empresária configurar impeditivo ao ressarcimento dos prejuízos causados ao consumidor (artigo 28, § 5º, CDC).

Na seara trabalhista, por analogia, desde há muito vinha sendo aplicada a teoria menor. Independente da justificativa para desconsiderar a personalidade jurídica, os principais questionamentos existentes orbitam sobre o procedimento para a responsabilização dos sócios, que nas execuções trabalhistas acabava por ser automático: não se encontrando bens em nome da sociedade executada, era determinado, pelo juiz, o redirecionamento da cobrança para os sócios ou administradores, sem qualquer possibilidade prévia de defesa.

O auge da controvérsia ocorreu com o início da vigência do Código de Processo Civil, instituído pela Lei nº. 13.105/2015, que trouxe o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, com regras próprias de tramitação estabelecidas nos artigos 133 a 137. De acordo com a legislação processual civil, para a responsabilização dos sócios ou administradores passou a ser imprescindível que o requerente comprove o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica, seguida de imediata oportunidade de defesa.

A aplicabilidade do incidente aos processos trabalhistas foi, inicialmente, prevista na Instrução Normativa nº. 39/2016 do Tribunal Superior do Trabalho e, posteriormente, positivada no artigo 855-A da CLT, incluído pela Lei 13.467/2017, a responsável pela Reforma Trabalhista. Estas normas, em especial a segunda, são de extrema importância para fulminar os argumentos anteriormente utilizados para afastar a aplicação do incidente ao processo do trabalho, quais sejam a inexistência de previsão legal expressa e a suposta incompatibilidade entre o procedimento e a celeridade que norteia as reclamatórias.

Têm-se, então, que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica é, atualmente, plenamente aplicável aos processos trabalhistas, de modo que, especialmente com o advento da Lei 13.467/2017, é direito do sócio, seja ele formal ou de fato, ver direcionada a execução trabalhista contra si somente por meio da instauração do incidente, sob pena de violação ao devido processo legal.

Os reflexos desta alteração são substanciais. Como demonstrado, antes da reforma trabalhista a lei possibilitava aos juízes do trabalho desconsiderar a personalidade jurídica das empresas até mesmo de ofício, sem ouvir a parte contrária. Permitia-se, assim, a responsabilização de sócios que sequer detinham qualquer poder de administração fossem responsabilizados por débitos trabalhistas.

Já na vigência das novas normas, multiplicam-se decisões como a recentemente proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro[1], em que, avaliando-se a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no caso, decidiu-se que acionista minoritário sem poder de gestão não responde por dívidas trabalhistas da companhia. No caso, o acionista detinha 0,08% do capital social de uma sociedade anônima.

Outra alteração importante no que concerne à responsabilidade dos sócios por débitos trabalhistas é aquela que registra, no artigo 10-A da CLT, também inserido pela Lei da Reforma Trabalhista, os limites à responsabilização do sócio retirante. É que, mesmo com a regra expressa no artigo 1.003 do Código Civil, não raro se viam decisões responsabilizando ex-sócios mesmo após o lapso temporal de dois anos contados da modificação do contrato social, fixados na legislação material. Comprovada a fraude na alteração societária, contudo, o sócio retirante responderá solidariamente com os demais.

Deve-se ter em mente que a aplicação do dispositivo considera apenas como sócio retirante aquele que teve o seu desligamento averbado no contrato social da empresa; o sócio retirante de fato, ou seja, aquele que se desliga apenas por instrumento particular sem, contudo fazer a devida averbação no órgão responsável, não terá direito à ordem preferencial, já que esse desligamento não terá eficácia.

Neste sentido, o TRT-RJ[2] também já se manifestou expressamente pela aplicação da reforma trabalhista, se posicionando no sentido de que o sócio retirante responde pelas dívidas da empresa somente até o limite de dois anos contados da data de averbação, perante a junta comercial, de sua saída do quadro societário. Proposta a ação trabalhista além desse limite, seria inviável atribuir responsabilidade ao sócio retirante quanto ao crédito trabalhista reconhecido em juízo.

Assim, ao incluir os artigos 10-A e 855-A no texto da CLT, a Lei 13.467/2017, quer quanto à limitação temporal da responsabilidade do ex-sócio nos casos de saída regular da sociedade, quer quanto ao procedimento a ser adotado para desconsideração da personalidade jurídica da empresa, conduz o processo trabalhista no sentido de imprimir previsibilidade, uniformidade e segurança aos jurisdicionados.

[1] Processo nº 0010300-06.2015.5.01.0046

[2] Processo nº 0018400-40.2008.5.01.0063


Regulação das Fintechs aquece o mercado financeiro

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Chamou a atenção do mercado financeiro a aprovação, pelo Conselho Monetário Nacional, da Resolução CMN nº. 4.656/2018. A norma, que passou por consulta pública, em resumo, estabelece requisitos mínimos para funcionamento das fintechs que oferecem crédito no Brasil.

Com a regulamentação, o CMN pretende aumentar a competitividade do Sistema Financeiro Nacional, fomentar o crédito e reduzir o seu custo para o tomador final. Há promessa, ainda, de maior segurança jurídica para as estruturas de concessão de crédito que contam com o auxílio da tecnologia e de plataformas eletrônicas para a prestação de serviços financeiros.

Isso porque a Resolução CMN nº. 4.656/2018 criou duas novas modalidades de instituições financeiras: a Sociedade de Crédito Direto (SCD) e a Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP). Neste contexto, permite-se que as fintechs atuem sem a necessidade de estarem vinculadas a instituições financeiras tradicionais, numa estrutura mais simples e com um feixe de contratos e de operações menos denso.

Nada impede, porém, que as parcerias com bancos continuem a ser utilizadas por essas plataformas. Isso ocorrerá caso essas fintechs entendam que os custos e o tempo que terão que dispender para conseguir autorização do Banco Central serão muito elevados e não compensarão os esforços. As fintechs devem ponderar, também, que terão que observar um conjunto maior de regras enquanto entidades reguladas do que enquanto meros correspondentes bancários, como veremos adiante.

Antes disso, relembra-se que tanto as SCD quanto as SEP devem se atentar às normas de sigilo estabelecidas na Lei Complementar nº. 105/2001, que prevê aplicação dos seus ditames a qualquer entidade reconhecida como instituição financeira pelo CMN.


Sociedade de Crédito Direto (SCD)

A SCD, conforme regulado na resolução, é a fintech que, prestando serviços exclusivamente por meio de plataforma eletrônica, tem por objeto a realização de operações de empréstimo, de financiamento e de aquisição de direitos creditórios com a utilização de recursos que tenham como única origem o capital próprio, sendo vedada a captação de recursos públicos.

É facultado às SCD ceder seus créditos para outras instituições financeiras, para fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC) e para companhias securitizadoras cujos ativos emitidos sejam destinados exclusivamente a investidores qualificados.

A Resolução prevê, ainda, a captação de recursos do público pela SCD exclusivamente por meio da emissão de ações.


Sociedade de Empréstimo entre Pessoas (SEP)

A SEP, por sua vez, tem por objeto a realização de empréstimo e de financiamento entre pessoas exclusivamente por meio de plataforma eletrônica. Pautada no modelo peer-to-peer de negócios, a SEP, mediante o uso de tecnologia, tem a capacidade de remover intermediários das operações de crédito realizadas, como por exemplo os bancos ou cooperativas de crédito, e assim, permitir uma interação mais direta entre as pessoas que necessitam de empréstimo e aquelas que estão dispostas a concedê-los.

Podem ser credores nas operações realizadas nas SEP as pessoas naturais, outras instituições financeiras, os FIDC, as companhias securitizadoras cujos ativos emitidos sejam destinados exclusivamente a investidores qualificados e as pessoas jurídicas não financeiras, exceto as companhias securitizadoras expressamente permitidas.

Foi autorizado, também, a aquisição, pelas SEP e por suas controladas ou coligadas, de cotas subordinadas do FIDC que invista exclusivamente em créditos originados na SEP, limitados a 5% do patrimônio do FIDC e desde que não configure assunção substancial dos riscos e benefícios.

É vedado, porém, que a SEP utilize recursos próprios ou exponha-se, direta ou indiretamente, ao risco de crédito das operações de empréstimo e de financiamento realizadas. A vedação atinge também as pessoas jurídicas controladas ou coligadas às SEP.

O CMN estabeleceu, ainda, que o limite máximo para que um mesmo credor possa contratar com um mesmo devedor na mesma SEP é de R$ 15.000,00. Esse limite, contudo, não é aplicável aos credores que sejam investidores qualificados.


Autorização de funcionamento

 O funcionamento das SCD e das SEP depende de prévia autorização do Banco Central do Brasil. Sobre o procedimento para obtenção desta autorização de funcionamento, a Resolução CMN nº. 4.656/2018 trouxe algumas simplificações, dispensando requisitos e etapas como a apresentação de proposta de constituição e funcionamento ao BACEN.

Definiu, entretanto, que tanto SCD quanto SEP devem ser constituídas sob a forma de sociedades anônimas, observando permanentemente o limite mínimo de R$ 1.000.000,00 em relação ao capital social integralizado e ao patrimônio líquido.

A participação de fundos de investimento no grupo de controle das SCD e SEP foi liberada, desde que em conjunto com pessoa ou grupo de pessoas. Neste caso, o BACEN poderá exigir adicional de capital social integralizado e patrimônio líquido.

De acordo com as novas normas, o BACEN poderá exigir, também, a celebração de acordo de acionistas, contemplando expressa definição do grupo de controle, direto ou indireto, da instituição objeto do processo de autorização.

Há necessidade, ainda, de explicitar as pessoas que compõem o grupo econômico de que seja integrante a instituição e que possam vir a exercer influência direta ou indireta nos negócios das SCD e SEP aspirantes ao funcionamento, além da comprovação da origem e da respectiva movimentação financeira dos recursos utilizados no empreendimento pelos controladores e pelos detentores de participação qualificada.

Por fim, é importante destacar que a dissolução da SCD ou da SEP ou a mudança de seu objeto social, que resulte na sua descaracterização como sociedade integrante do sistema financeiro, implica o cancelamento da respectiva autorização para funcionamento.


PL 1.220/15: Regras para a desistência de compra de imóveis na planta prometem reduzir conflitos judiciais e incentivar o setor Imobiliário

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No início do mês de junho, mais precisamente no dia 06, foi aprovado pelo Plenário da Câmara dos Deputados o texto do Projeto de Lei nº 1.220/15, que regulamenta a desistência da compra de imóveis na planta.

O texto, que ainda segue para aprovação do Senado Federal, a princípio, regulamentava a “desistência do contrato de incorporação imobiliária com a retenção de até 10% (dez por cento) do valor pago por parte da incorporadora”.

Agora, porém, com a aprovação em conjunto do PL 2616/2015, do PL 3098/2015, do PL 8667/2017, e do PL 10114/2018, o texto original foi alterado, através do Substitutivo apresentado pelo deputado Jose Stédile (PSB-RS).

Com essas alterações, o PL 1220/15 passou a regular de maneira mais equilibrada e justa, seguindo o mesmo caminho que a jurisprudência maciça do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e da maioria dos Tribunais de Justiça, o que certamente trará benefícios à economia do país e mais segurança ao mercado imobiliário e aos próprios consumidores.

Isso porque, diante da ausência de regulamentação do tema, multiplicaram-se as ações judiciais, em especial nos casos em que o consumidor desistia, por qualquer motivo, da compra do imóvel antes da entrega.

O número de processos foi tão significativo que o STJ chegou a editar súmula sobre o assunto. O enunciado de nº 543 fixou o entendimento de que “na hipótese de resolução do contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento”.

Apesar disso, a utilização do termo “parcialmente” não impedia novos litígios entre compradores e vendedores acerca dos percentuais que seriam devidos quando do distrato, de modo que o PL 1220/15, ao fixá-los, tende a promover a segurança jurídica, afastando a análise casuística.

A rescisão do contrato por responsabilidade do contratante, seja por inadimplemento ou por desistência, passará a ter regulação específica. Nestes casos, o PL prevê que o adquirente será restituído, em até 180 dias contados do desfazimento do contrato, dos valores que houver pago, após efetuadas as deduções da taxa de corretagem, na sua integralidade, e da pena convencional prevista em contrato, que não poderá ser maior que 25% da quantia paga.

Situação diversa ocorre nos casos em que for utilizado o regime de patrimônio de afetação, instituído pela Lei 10.931/2004, em que o empreendimento e a construtora mantém CNPJ e contabilidade separadas.

A restrição de crédito para o setor imobiliário e o alto índice de distratos fizeram com que a tendência do sistema financeiro passasse a ser a de privilegiar empreendimentos com patrimônio afetado por causa da maior segurança de retorno. Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) indicam o crescimento desse mecanismo desde 2016 na venda de imóveis na planta na maioria das grandes empresas do setor.

Com o patrimônio afetado, as parcelas pagas pelos compradores não se misturam ao patrimônio da incorporadora ou construtora e, se ela entrar em dificuldades financeiras, não poderá fazer parte da massa falida.

Esses motivos fizeram com que o PL 1.220/15 estabelecesse regras diferentes para os casos de empreendimento submetido ao regime de patrimônio de afetação, de modo que a restituição dos valores ao adquirente deverá ser paga no prazo de 30 dias após o habite-se ou documento equivalente emitido pelo órgão público municipal competente e a multa poderá ser estabelecida até o limite de 50% da quantia paga.

Com isso, o Poder Legislativo visa incentivar a continuidade das obras e a entrega das unidades aos futuros donos não desistentes, mesmo em caso de falência da construtora.

Em ambos os casos – patrimônio de afetação ou não – é vedada a incidência de cláusula penal nos casos em que o adquirente que der causa ao desfazimento do contrato encontrar comprador substituto que assuma as obrigações contidas no contrato original, desde que haja a devida anuência do incorporador e a aprovação dos cadastros do comprador substituto. O novo mutuário deverá comprovar capacidade financeira para arcar com a dívida.

Outra novidade importante é a instituição do direito de arrependimento, que permite que o adquirente, em até 7 (sete) dias, desista do contrato firmado em estandes de vendas e fora da sede do incorporador, sendo, nesse caso, garantida a devolução integral de todos os valores antecipados – inclusive da comissão de corretagem.

Por fim, sobre o atraso na entrega, o projeto prevê o prazo de até 180 dias de prorrogação sem multa ou motivo de rescisão contratual se houver cláusula contratual sobre o tema.

Depois desses seis meses, o comprador poderá rescindir o pacto e receber todos os valores pagos corrigidos em até 60 dias após o distrato. Caso escolha continuar com o empreendimento mesmo com atraso na entrega do imóvel, o mutuário receberá uma indenização de 1% do valor pago à incorporadora para cada mês ultrapassado do prazo.

 


A Lei 13.670/2018 e a Reoneração da Folha de Salários

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Instituída em 2011 como obrigatória, desde 2015 a Contribuição Previdenciária sobre Receita Bruta (CPRB) é disciplinada como alternativa à Contribuição Previdenciária sobre Folha de Salários, ficando popularmente conhecida como “desoneração da folha”.

A opção por uma das duas formas de apuração cabe ao contribuinte e deve ser exercida no mês de janeiro, vinculando-o, de modo irretratável, até o final do respectivo ano-calendário.

Há algum tempo, contudo, o fim da CPRB vem sendo cogitado pelo Presidente Michel Temer. Chegou, inclusive, a ser objeto da Medida Provisória 774/17, mas a pressão dos setores afetados e as sucessivas decisões judiciais favoráveis aos contribuintes acabaram por forçar a sua revogação.

A Paralisação dos Caminhoneiros, deflagrada no último dia 21, renovou o fôlego para discussão da iniciativa, a ponto do Governo Federal, para atender às reivindicações do setor de transporte rodoviário de carga, em especial a redução da CIDE sobre o diesel, enxergar a reoneração como contrapartida orçamentária interessante.

Sobre o tema, o Ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, chegou a declarar à imprensa[1] que o que o governo deixará de arrecadar com a Cide será compensado com os setores que serão reonerados.

Nestes termos, selado o acordo com a Câmara e o Senado, foi publicada, no dia 30.05.2018, a Lei 13.670. Referida norma estabelece, como regra geral, que o ano de 2020 será o último em que se facultará ao contribuinte recolher a contribuição previdenciária sobre a receita bruta. Há que se ter cuidado, contudo, com as exceções.

É que, em seu artigo 12, II, a “Lei da Reoneração” revoga dispositivos da Lei 12.546/11, que instituiu e regula a CPRB. Tal modificação, na prática, obriga, a partir de 01.09.2018, que diversos setores econômicos, como os de transporte ferroviário de cargas, transporte aéreo e marítimo, manutenção e reparação de aeronaves e embarcações, hoteleiro, além de alguns ramos da indústria e o comércio varejista de determinadas categorias voltem a recolher a contribuição previdenciária sobre a folha de salários.

A previsão de observância da anterioridade nonagesimal, que impede a cobrança de contribuições antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que as instituiu ou modificou (artigo 195, § 6º, da Constituição Federal), contudo, não parece ser suficiente para validar a alteração legislativa em comentário, ao menos no que se refere ao ano de 2018.

Isso porque, a Lei 12.546/11 define, por meio do artigo 9º, § 13, que a opção pela CPRB será anual e irretratável para todo o ano calendário.

Assim, as pessoas jurídicas dos setores descritos que exerceram corretamente o seu direito de opção pelo regime de apuração da CPRB para todo o ano-calendário de 2018, realizando o seu planejamento orçamentário anual também levando em consideração esse fator, foram surpreendidas com a publicação da Lei 13.670/18, que, arbitrariamente, revogou esse regime de apuração em relação às atividades por elas exercidas, com efeitos a partir de 01.09.2018.

As mudanças trazidas pelo artigo 12, II, da Lei 13.670/18, violam, assim, o ato jurídico perfeito e o direito adquirido, protegidos pelo inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal, de quem optou por se manter em um regime de apuração de contribuição previdenciária, dito irretratável, até o final do ano-calendário corrente.

Fato é que, quando a Lei nº. 12.546/11 estabeleceu que a opção pelo regime de apuração da CPRB se estenderia por todo o ano-calendário, inclusive, o de 2018, diversas empresas a exerceram, confiando na estabilidade mínima de validade dos efeitos dessa escolha. Como contribuintes de boa-fé, confiaram na norma posta e atuaram segundo os seus ditames, programando as suas atividades econômicas para o formato escolhido.

No popular, entraram no jogo conhecendo as regras do jogo e confiando que essas regras prevaleceriam até o seu termo final (dezembro/2018). E, frise-se, isso é o mínimo que se espera de um país que possui em seu ordenamento jurídico a figura da segurança jurídica como princípio e a consequente manifestação da estabilidade das relações jurídicas firmadas, sejam estas entre particulares ou entre entes públicos e particulares.

Não é outro o entendimento de juristas como Heleno Taveira Torres[2] e Humberto Ávila[3], que elencam, ao menos, três aspectos protegidos pelo princípio da segurança jurídica, quais sejam: certeza jurídica ou cognoscibilidade, estabilidade do ordenamento jurídico ou calculabilidade e confiança na efetividade dos direitos e liberdades fundamentais ou, simplesmente, confiabilidade.

Sendo assim, observa-se que, de uma só vez, a edição da Lei 13.670/18, em especial de seu artigo 12, II, rompe com esses três aspectos protegidos pela segurança jurídica. Aliás, de uma só vez ela rompe com a segurança em que se pautaram as empresas no exercício legal do seu direito de opção; com a boa-fé por elas demonstradas ao cumprir o disposto em norma posta e planejar o adimplemento de suas obrigações tributárias anuais; e com a proteção da confiança que deveria haver entre elas e o ente público com o qual “acordou”, mediante lei, a realização da apuração da referida contribuição.

Neste contexto, tal qual ocorreu quando da publicação da MP 774/2017, recairá sobre o Poder Judiciário a responsabilidade de fazer valer o texto constitucional, determinando que a alteração do regime só pode ser admitida como válida a partir de janeiro de 2019.

[1] http://www.valor.com.br/brasil/5542095/governo-condiciona-fim-da-cide-sobre-diesel-ao-projeto-de-reoneracao

[2] TORRES. Heleno Taveira. Direito constitucional tributário e segurança jurídica: metódica da segurança jurídica do sistema constitucional tributário. 2. ed. São Paulo: Ed. RT, 2012. P.192.

[3] ÁVILA. Humberto. Segurança jurídica. Entre permanência, mudança e realização do direito tributário. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 250/256.

 


Planejamento Sucessório: indispensável no atual cenário de elevação do imposto sobre herança

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O Planejamento Sucessório é o meio utilizado para encontrar formas de otimizar e reduzir custos da transmissão de patrimônio por ocasião da sucessão, devendo ser executado o quanto antes para evitar o demorado e custoso inventário, afastando assim a incidência do cada vez mais alto imposto sobre heranças.

Isso porque o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação (ITD), tributo incidente sobre heranças e doações é, por atribuição Constitucional, instituído e cobrado pelos Estados. Sua alíquota varia de acordo com a localidade em que processado o inventário ou arrolamento, no caso de bens móveis, ou o domicílio em que se encontrarem os bens imóveis.

 

Histórico de aumento do ITD nos últimos anos
O percentual máximo para cobrança do ITCD é definido pelo Senado Federal que, atualmente, permite que os Estados arrecadem até 8% sobre a herança.

Até 2015, somente o Estado de Santa Catarina adotava a alíquota de 8%. A partir daquele ano, em virtude da situação econômica em que se encontra o país, pelo menos doze outros estados majoraram o imposto, sendo que mais da metade deles passou a exigir o máximo permitido.

Membro deste último grupo é o Estado do Rio de Janeiro que, não satisfeito em aumentar o teto do ITD de 4% para 5% em 2016, aprovou, em 16 de novembro de 2017, a possibilidade de incidência do imposto sobre heranças à alíquota de 8%, nos casos em que o patrimônio a ser destinado aos sucessores supere o montante de 400.000 UFIR-RJ, que em 2018 corresponde ao valor de R$ 1.317.560,00 (um milhão trezentos e dezessete mil quinhentos e sessenta reais).

As novas regras do território fluminense estão em vigor desde o dia 01 de janeiro de 2018.

Diante do cenário de calamidade financeira instalado no Palácio Guanabara, exemplificado pela situação de baixos níveis de investimento e pelo alto déficit financeiro nas contas públicas, pode-se inferir que o imposto sobre heranças só não superou os 8% no Estado do Rio de Janeiro por assim não lhe ser permitido.

Já houve, todavia, recente movimento do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), órgão que conta com representantes de todos os Estados brasileiros, no sentido de propor ao Senado Federal o aumento do imposto sobre herança para o patamar de 20%. Apesar de em um primeiro momento a iniciativa ter encontrado resistência na Casa Legislativa, é bastante provável que os Estados, em busca de maior arrecadação, mantenham a pressão para a majoração do ITD.

Este cenário de elevação da carga tributária sobre a herança, somado à morosidade notória do judiciário, faz com que o Planejamento Sucessório, assim entendido como a análise da forma mais prática e menos custosa de se promover a sucessão patrimonial, torne-se indispensável.

 

Vantagens do Planejamento Sucessório

A gestão e a sucessão patrimonial são preocupações constantes em pessoas que, após uma vida inteira de trabalho duro, acumulando bens que, em tese, permitiriam um período de aposentadoria menos turbulento e garantiriam um futuro mais confortável para seus filhos e familiares, se deparam com as complexidades dos procedimentos jurídicos tradicionais.

Não raramente têm-se notícias de inventários que perduram por mais de 20 anos na Justiça, de bens inicialmente adquiridos para o sustento das gerações futuras sendo utilizados para pagamento de dívidas empresariais, ou mesmo dos altíssimos impostos incidentes sobre a herança que, como visto anteriormente, recentemente foram elevados e tendem a serem ainda maiores num futuro próximo.

A busca por formas de blindar o patrimônio adquirido pensando no futuro dos filhos, bem como em hipóteses de conferir maior dinamicidade e menor custo à transferência dos bens é intensa, mas carece de cuidados.

Não há fórmula mágica. Há, porém, a possibilidade de realização de uma análise ampla, técnica e apurada, o Planejamento Sucessório, que consiste justamente em identificar as demandas específicas do detentor dos bens e orientá-lo no sentido do atendimento de suas necessidades da forma mais eficiente e econômica possível.

 

Holding familiar

Cada família e cada patrimônio têm suas peculiaridades que devem ser minuciosamente avaliadas para que o resultado final seja, de fato, satisfatório. Até por isso, uma das ferramentas de Planejamento Sucessório mais flexíveis, ou seja, que consegue atender o maior número de situações, é a chamada holding familiar.

Outros arranjos societários existentes envolvem modelos como empresas offshore, ou seja, sediadas em territórios estrangeiros, sendo esta escolha a conclusão de um intenso trabalho de profissionais especializados.

A definição do tipo societário mais compatível com as necessidades do caso deve alinhar-se à realidade do negócio do empresário, riscos operacionais, estruturas familiares, patrimônio envolvido e aspectos tributários, podendo ser adequadamente enquadrado para médias e pequenas empresas.

O caminho natural a ser percorrido para uma decisão assertiva perpassa, necessariamente, o levantamento dos haveres das pessoas físicas e/ou jurídicas relacionadas. Após esta análise contábil e avaliativa, é possível identificar os cenários mais propícios para o caso.

A partir desta definição, são traçadas as estratégias de blindagem patrimonial e as condições de administração, gestão, acordos de acionistas e sucessão patrimonial, que podem implicar em alteração de sociedades já existentes ou mesmo na constituição de novas pessoas jurídicas.

Dessa forma, além de proteger o patrimônio a ser repassado aos herdeiros de eventuais reflexos negativos da atividade empresarial principal, é possível limitar ou até mesmo afastar completamente a possibilidade de disputa entre sucessores que eventualmente viria a ocorrer em sede de inventário judicial.

Nada obstante, a simplificação e proteção da sucessão não são as únicas vantagens obtidas. Caso a opção seja pela holding familiar, por exemplo, a desnecessidade de abertura de processo de inventário afasta, também, a incidência de imposto sobre a herança (ITD) e das custas judiciais, que a depender do patrimônio e da quantidade de herdeiros, podem atingir quantias bastante representativas.

É que, nesta estrutura societária, basicamente transfere-se o patrimônio objeto da futura sucessão à pessoa jurídica alterada ou recém constituída por meio de integralização do capital social em bens, operação que, em regra, por força constitucional, não é tributada. No mesmo contexto, são atribuídas aos herdeiros cotas sociais da pessoa jurídica administradora do patrimônio, de modo que, em caso de falecimento de qualquer dos sócios, os bens constantes da sociedade sejam destinados aos demais sócios pela própria sistemática empresarial inerente ao modelo adotado sem incidência de ITD.

Ocorre tributação da integralização, entretanto, por incidência do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) nos casos em que imóveis são transferidos para sociedade que tem como objeto a locação destes, diminuindo ou até eliminando a economia de ITD obtida quando da destinação do patrimônio aos herdeiros. Deve-se ponderar, porém, que a tributação por pessoa jurídica é extremamente mais vantajosa que a por pessoa física quando o assunto é o recebimento de aluguéis, pelo que o tema exige, invariavelmente, a atuação de especialistas.

Assim, têm-se que a adesão a um Planejamento Sucessório bem feito, atento às necessidades de cada situação, promove a proteção e otimização do patrimônio acumulado ao mesmo tempo que facilita e reduz os custos quando da ocorrência da sucessão.

 


Greve dos caminhoneiros reascende debate pela reforma tributária

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No dia 21.05.2018, foi deflagrada paralisação nacional dos caminhoneiros. Dentre as reivindicações do setor, destacam-se a revisão da política de variação de preço, em especial do óleo diesel, realizada pela Petrobras; o fim da cobrança de pedágio pelo chamado “eixo suspenso”; e a redução da carga tributária sobre os combustíveis.

As negociações, centradas no Governo Federal, tiveram impacto direto tão somente nas condições que cabem a tal ente público interferir. Foram editadas, então, três medidas provisórias, publicadas no Diário Oficial da União do dia 30.05.2018, para garantir o acordo com os caminhoneiros e reduzir em aproximadamente R$ 0,46 o preço do litro do diesel.

O Presidente Michel Temer editou, ainda, decreto que reduziu a CIDE sobre o diesel.

Embora no curto prazo as medidas resultem em diminuição do preço do combustível, há que se observar a figura completa: redução nominal e apressada de tributos gera renúncia de receita, que precisa ser compensada com aumento de arrecadação em outros setores. Tanto é assim que, no mesmo dia 30, o Presidente da República sancionou a Lei da “reoneração” da folha de pagamentos e já anunciou que reduzirá os benefícios concedidos aos exportadores como meios de compensar o crédito suplementar de 9,58 bilhões de reais aberto para garantir as medidas.

Não se duvida que parte significativa da redução de preços realmente deve partir da revisão da carga tributária. A gasolina, por exemplo, tem o preço formado por média de 29% de tributos estaduais, como o ICMS, e 16% de tributos federais, como a CIDE, o PIS e a COFINS. A discussão, contudo, precisa ser mais profunda e não pautada apenas em métodos paliativos.

Em 11.04.2018, diante de autoridades da área econômica e da Casa Civil, o IPEA lançou o projeto Desafios da Nação[1], que reúne diagnósticos e propostas para viabilizar o crescimento sustentado do país, tendo como foco principal a elevação da produtividade.

No documento, chama a atenção o Capítulo 5, intitulado Reforma Tributária – Racionalizar o sistema tributário, especialmente o enfoque dado aos tributos indiretos. É possível perceber que o próprio Governo Federal reconhece o sistema tributário brasileiro como uma “estrutura desconexa e caótica”, repercutindo negativamente em aspectos como o crescimento econômico, a competitividade nacional e a distribuição de renda.

Interessante, ainda, é a comparação gráfica entre países com sistema de governo semelhante ao brasileiro, cuja reprodução é indispensável para compreensão do tema:

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Basta um olhar superficial para visualizar um dos principais problemas do sistema tributário nacional: a intensa representatividade dos ali chamados “impostos sobre bens e serviços”, também conhecidos como tributos indiretos, uma vez que, embora sejam recolhidos e pagos pelos produtores, prestadores de serviço e pelos comerciantes, acabam atingindo indiretamente os consumidores finais, por conta da inclusão dos tributos nos preços das mercadorias e dos serviços, tal como ocorre tanto com a gasolina quanto com o óleo diesel.

A prevalência de tributos indiretos conduz o sistema à injustiça, já que a regressividade da tributação sobre o consumo acaba por onerar mais gravemente os mais pobres. Além disso, referidos tributos indiretos são desarmônicos entre si e fortemente cumulativos, na medida em que compõe um a base de cálculo do outro e, em alguns casos, até a própria base de cálculo, no chamado “cálculo por dentro”.

Para além da carga tributária nominal, há a complexidade do sistema, cujos vícios são substancialmente aprofundados pela diversidade de competências tributárias (em especial Estaduais e Municipais), que propiciam assustadora diferença entre legislações sobre os mesmos impostos e uma impressionante diversidade de alíquotas, provocando cumulação de créditos estruturais e perda da neutralidade do tributo, tudo agravado em razão do crescente número de isenções e benefícios fiscais.

Passo importante na evolução do modelo tributário foi dado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706, em que se firmou a tese de que o ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. Os reflexos da decisão já vêm sendo observados também em outros tributos, de modo que estão sendo proferidas decisões, por exemplo, também pela exclusão do ISS e da CPRB da base de cálculo do PIS e da COFINS.

Estas decisões, todavia, somente se aplicam aos contribuintes que ingressarem em juízo deduzindo tais pretensões, de modo que a necessidade de uma solução efetiva para o problema se mantém e passa, invariavelmente, por uma reforma estrutural. Em atenção a isso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pretende dar andamento à proposta de reforma tributária relatada pelo deputado Luiz Carlos Hauly.

Da medida, o que mais se destaca é a proposta de instituição do internacionalmente utilizado imposto único sobre o consumo, que por aqui chamar-se-á Imposto Sobre Operações de Bens e Serviços (IBS). Se aprovado como apresentado, o IBS substituiria ICMS, IPI, PIS, COFINS, CIDE, Pasep, IOF e Salário-educação, com repasse automático aos governos com a respectiva proporção destinada a municípios, estados e União.

Inciativas da espécie tendem a tornar a tributação mais simples, clara, justa e previsível, reduzindo os custos do setor produtivo. É indispensável, porém, que sejam aliadas à redução de gastos e aumento da eficiência do setor público.

[1] http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/180327_desafios_da_nacao.pdf