Interrupção de recebimento de faturas de cartão pelos correios não enseja danos morais
A interrupção do recebimento de faturas de cartão pelos correios não enseja danos morais. Assim entenderam dois juízes do RJ ao negarem pedidos de indenização por danos morais a clientes que alegaram dificuldade para o pagamento do débito. As ações foram patrocinadas pelo CMartins.
Confira matéria publicada no Migalhas. Acesse: http://bit.ly/2puGZse
Os desdobramentos das novas regras de cobrança do ISS de Operadoras de Planos de Saúde e Administradoras de Cartão de Crédito
Em 30.12.2016, após longos debates, foi aprovada a Lei Complementar nº 157, que alterou dispositivos do texto da LC nº 116, que disciplina as regras gerais do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS).
Referida aprovação foi seguida por uma “queda-de-braço” travada entre o Poder Executivo, por meio do Presidente da República, Michel Temer, e o Poder Legislativo, representado pelo Congresso Nacional.
Isso porque as inclusões dos incisos XXIII e XXIV ao artigo 3º da Lei Complementar nº 116, aprovadas pelo Poder Legislativo, foram vetadas pela Presidência. Os congressistas, nada obstante, derrubaram o veto presidencial e, em 01.06.2017, publicaram a Lei Complementar nº 157.
Os incisos XXIII e XXIV, definitivamente inseridos no ordenamento jurídico brasileiro após o conflito, são polêmicos e promoveram significativas mudanças, especialmente no que se refere ao ISS de operadoras de planos de saúde e ao ISS de administradoras de cartão de crédito.
É que, regra geral, o ISS é devido no local do estabelecimento prestador (artigo 3º da LC nº 116). A partir da publicação da LC nº 157, entretanto, com a inclusão dos incisos citados, o ISS passou a ser devido, nos serviços de operação de plano de saúde e de administração de cartão de crédito, no Município do domicílio do tomador.
A inovação legal, que a olhos menos atentos pode parecer inofensiva, traz consequências catastróficas. Sob o pretexto de distribuir mais uniformemente os valores recolhidos com o imposto municipal que, segundo dados da Confederação Nacional dos Municípios[1], concentra em 35 municípios 63% da arrecadação nacional a tal título, a Lei Complementar nº 157 pode, em verdade, contribuir para o isolamento dos pequenos municípios do país.
Outro argumento, este mais utilizado por Municípios maiores, como Rio de Janeiro e São Paulo, é o de que, antes das alterações trazidas pela Lei Complementar nº 157, perdiam arrecadação porque empresas prestadoras de serviços de operação de plano de saúde e de administração de cartões de crédito, embora tivessem como grande parte dos consumidores aqueles que residem em metrópoles, acabavam se instalando em municípios menores, em busca de benefícios fiscais ou alíquotas inferiores, na chamada Guerra Fiscal.
Tanto é assim que pouco tempo depois da publicação da Lei Complementar nº 157 o Município do Rio de Janeiro editou a Lei nº 6.263/2017 e o Município de São Paulo editou a Lei nº 16.757/17, ambas prevendo, para o ano de 2018, a exigência de observância das regras de recolhimento do ISS no domicílio do tomador dos serviços descritos.
Por mais que se argumente que o montante a ser pago em ISS de administradoras de cartão de crédito e em ISS de operadoras de planos de saúde não seja consideravelmente aumentado, tendo em vista as travas de alíquota mínima (2%) e máxima (5%) estabelecidas pela própria Lei, os custos vão muito além do tributo.
Segundo dados do Banco Mundial, o Brasil é o país onde se gasta mais tempo para pagar impostos[2]. As alterações promovidas pela Lei Complementar 157 contribuem para o agravamento da situação, uma vez que exigem que administradoras de cartões de crédito e das operadoras de planos de saúde acompanhem, diariamente, a legislação de cada município em que tenha consumidores para que consigam pagar o imposto devido.
De acordo com a Associação Brasileira de Planos de Saúde, dos 5.570 municípios existentes em nosso país, cerca de 3.800 têm menos de 1.000 beneficiários de planos de saúde. Em relação aos cartões de crédito, os números são similares. Estes consumidores, por conta das mudanças promovidas na legislação, tendem a ou ter que pagar mais caro pelos mesmos serviços ou, o que é mais provável, não poder contar mais com estes, já que serão, financeiramente, deficitários.
A ausência de praticidade tributária e o aumento dos custos das prestadoras que, invariavelmente, serão repassados aos consumidores foram, inclusive, citadas na Mensagem de Veto, emitida pelo Presidente da República ao se opor às alterações comentadas.
Além dos contornos práticos, há que se observar o artigo 146 da Constituição Federal, que trata especificamente das matérias que podem ser reguladas por Lei Complementar.
Nota-se que não há, nos incisos II e III deste artigo, menção à possibilidade de edição de Lei Complementar que altere a definição de sujeito ativo da relação jurídico-tributária, de modo que a justificativa constitucional para sistemática prevista pela Lei Complementar nº 157 deveria enquadrar-se no inciso I.
Este inciso possibilita a edição de Lei Complementar para tratar de conflitos de competência tributária, ou seja, para evitar a chamada Guerra Fiscal.
Sobre os conflitos de competência territorial tributária, têm-se como plenamente justificável a edição de Lei Complementar com definição expressa do sujeito ativo, em matéria de ISS, quando um serviço é prestado em mais de um município ao mesmo tempo ou quando o prestador, embora estabelecido em um município, preste serviços em outro.
Invariavelmente, todavia, há necessidade de que se verifique elemento de conexão entre realidade e determinação normativa, que para o ISS é a prestação de alguma atividade que componha o serviço no Município indicado como sujeito ativo pela legislação.
Não há como se estabelecer, seja para acabar com a Guerra Fiscal, seja para melhorar a distribuição dos recursos, que o ISS das operadoras de planos de saúde e o ISS das administradoras de cartões de crédito seja recolhido para município que não se relacione, ainda que minimamente, como fato gerador do tributo.
Exemplo disso é que as exceções à regra de que o ISS seria devido ao Município do “estabelecimento prestador”, previstas nas redações originárias dos artigos. 12, ‘a’ do Decreto Lei nº 406/68 e 3º da Lei Complementar nº 116, sempre trataram de situações em que havia algum serviço preponderantemente prestado no domicílio do tomador.
Indispensável, portanto, analisar a prestação de serviço em si para que se verifique a existência ou não de elemento de conexão apto a justificar a tributação de ISS das administradoras de cartão de crédito pelo município em que residente o tomador.
OS SERVIÇOS DE ADMINISTRAÇÃO DE CARTÕES DE CRÉDITO
As vendas com pagamentos realizados por meio de cartões de crédito inseridos em máquinas locadas ou de propriedade de estabelecimentos comerciais são o principal foco da alteração promovida. Resta saber, então, se alguma parte do serviço é efetivamente prestado na localidade da venda, de modo a existir o elemento de conexão citado que autorizaria a previsão de tributação pelo município em que domiciliado o tomador.
Na operação, o credenciador recebe solicitação de autorização do estabelecimento comercial para aceitar a operação. O credenciador solicita autorização para a bandeira que, por sua vez, envia a solicitação ao emissor. O emissor autoriza a transação. O emissor envia a fatura para o cliente. O emissor repassa o valor recebido ao credenciador, descontada a tarifa de intercâmbio. O credenciador repassa o valor da compra ao estabelecimento, deduzido da taxa de desconto. O credenciador remunera a bandeira pelo serviço prestado.
Os serviços que envolvem os cartões de crédito perfectibilizam-se nos estabelecimentos das administradoras (Emissores e Credenciadores), onde estão localizados todos os recursos humanos e tecnológicos para processamento das operações. Não há sequer um trecho do serviço que ocorra no domicílio do tomador (portador ou estabelecimento comercial).
O fato de a máquina de cartão estar localizada no estabelecimento comercial também não parece autorizar a cobrança do ISS no Município do referido estabelecimento. Isso porque o equipamento físico apenas captura os dados da operação (por exemplo, número do cartão, senha e valor) e os transmite ao credenciador (por exemplo, a Cielo) que os retransmitirá em tempo real à bandeira (por exemplo, Visa) e ao emissor do cartão (por exemplo, Banco do Brasil). A partir disso, as atividades necessárias para a autorização, o processamento e a cobrança da transação serão realizadas exclusivamente pelos estabelecimentos de cada agente financeiro (credenciador, bandeira e emissor).
Estas e outras possíveis inconstitucionalidades da Lei Complementar nº 157 já estão submetidas à apreciação do Supremo Tribunal Federal, na ADI 5.835, ajuizada pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF) e pela Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSEG).
No STF, o relator do caso, Ministro Alexandre de Morais, determinou a submissão da questão ao chamado rito abreviado o que, em tese, resultará em julgamento mais rápido da questão.
Paralelo a isso, algumas operadoras de planos de saúde têm recorrido individualmente ao judiciário e, em casos julgados em Rio Claro (SP) e Curitiba (PR), foram concedidas liminares suspendendo os efeitos de diversas leis municipais, em favor das operadoras que ajuizaram as ações, especialmente na parte em que alteraram o local de recolhimento do ISS incidente sobre seus serviços para o local do domicílio do tomador.
A justificativa é que, assim como ocorre com o ISS de administradoras de cartões de crédito, o ISS de operadoras de planos de saúde dever ser recolhido para o município com o qual efetivamente haja elemento de conexão com o serviço prestado.
[1] http://www.cnm.org.br/cms/images/stories/comunicacao_novo/links/HistoricoISS.pdf
[2] http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-e-o-pior-pais-do-mundo-para-pagar-impostos-diz-banco-mundial,70002067604