Demora em fila de banco não gera dano moral individual para consumidor, decide Quarta Turma

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a demora em fila de atendimento bancário não lesa o interesse existencial juridicamente tutelado do consumidor e, portanto, não gera direito à reparação por dano moral de caráter individual.
Com esse entendimento, o colegiado, de forma unânime, reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) que havia fixado em R$ 1 mil indenização por dano moral para consumidor que passou mais de duas horas esperando atendimento em fila de banco.
Segundo os autos, um advogado ajuizou ação individual contra um banco afirmando que teve de esperar duas horas e 12 minutos na fila para recadastrar seu celular em agência na cidade de Ji-Paraná (RO), a fim de poder realizar movimentações financeiras em sua conta.
Ele argumentou que leis municipal e estadual estabelecem 30 minutos como prazo máximo para atendimento e que, mesmo já tendo sido condenado com base nessas leis, o banco não tem melhorado a qualidade do atendimento. Por isso, o advogado requereu indenização de danos morais no valor de R$ 5 mil.
A sentença julgou o pedido improcedente. O TJRO deu provimento à apelação e fixou a indenização em R$ 1 mil. O banco recorreu ao STJ pedindo a reforma do acórdão.
Uniformização
O relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que a questão não tem recebido tratamento uniforme no STJ. Ele observou que, em casos semelhantes, a Terceira Turma já admitiu a indenização de dano moral coletivo (REsp 1.737.412), com base na “teoria do desvio produtivo do consumidor”.
O ministro citou ainda decisão da Segunda Turma (REsp 1.402.475) que também entendeu ser possível o pagamento de dano moral coletivo por descumprimento de norma local sobre tempo máximo de espera em fila.
Salomão frisou ser importante a uniformização da jurisprudência sobre o tema, ainda mais quando se trata de consumidor pleiteando indenização individual por dano moral decorrente da espera em fila de banco.
Mero desconforto
O Código de Defesa do Consumidor, lembrou o ministro, exige de todos os fornecedores de serviços atendimento adequado, eficiente e seguro. Ele também mencionou o Código Civil e a obrigação de reparação de dano, independentemente de culpa, nos casos especificados na legislação.
Citando a doutrina, Salomão destacou que, para caracterizar a obrigação de indenizar, não é decisiva a questão da ilicitude da conduta, tampouco se o serviço prestado é de qualidade ou não. Para o relator, é necessária a constatação do dano a bem jurídico tutelado.
Segundo afirmou, não é juridicamente adequado associar o dano moral a qualquer prejuízo economicamente incalculável ou a mera punição.
“A espera em fila de banco, supermercado, farmácia, para atendimento por profissionais liberais, em repartições públicas, entre outros setores, em regra é mero desconforto que, segundo entendo, a toda evidência não tem o condão de afetar direito da personalidade, interferir intensamente no bem-estar do consumidor de serviço”, observou.
Litigância frívola
Segundo o ministro, pedir a reparação por dano moral para forçar o banco a fornecer serviço de qualidade desvirtua a finalidade da ação de dano moral, além de ocasionar enriquecimento sem causa.
“De fato, o artigo 4º, II, alíneas ‘a’ e ‘b’, do Código de Defesa do Consumidor estabelece que a Política Nacional das Relações de Consumo implica ação governamental para proteção ao consumidor, sendo certo que, presumivelmente, as normas municipais que estabelecem tempo máximo de espera em fila têm coerção, prevendo a respectiva sanção (multa), que caberá ser aplicada pelo órgão de proteção ao consumidor competente, à luz de critérios do regime jurídico de direito administrativo”, disse.
Ao julgar improcedente o pedido formulado na ação inicial, Salomão ressaltou ainda que o Judiciário não está legitimado e aparelhado para estabelecer limitações à autonomia privada, o que poderia ter consequências imprevisíveis no âmbito do mercado e prejudicar os consumidores, principalmente os mais vulneráveis.
“No exame de causas que compõem o fenômeno processual da denominada litigância frívola, o magistrado deve tomar em consideração que, assim como o direito, o próprio Judiciário pode afetar de forma clara os custos das atividades econômicas, ao não apreciar detidamente todas as razões e os fatos da causa”, destacou.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1647452
Fonte: STJ
A impossibilidade de adoção da equidade como regra na fixação de honorários advocatícios

Os honorários advocatícios no processo civil sempre foram objeto de muitas discussões quanto aos critérios para o seu arbitramento, principalmente por conta de haver no ordenamento jurídico, em especial no Código de Processo Civil de 1973 – Lei Federal 5869/73, a possibilidade de, em certos casos, utilizar-se de critério baseado na equidade para seu arbitramento.
Conforme versava o artigo 20, § 3º, do Código de Processo Civil de 1973, apenas nas causas em que havia condenação eram aplicados os percentuais de 10 (dez) a 20 (vinte) por cento sobre os valores arbitrados [1].
Assim, em todas as outras hipóteses que não a de condenação, e ainda excluídos os casos de condenação da fazenda Pública, os honorários eram arbitrados conforme apreciação equitativa do juiz [2], atendidos (i) o grau de zelo do profissional; (ii) o local da prestação dos serviços, e; (iii) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço.
A rigor, não tivesse o processo uma sentença de condenação – e excluindo-se os casos em que a condenação se dava em face da Fazenda Pública – os honorários eram arbitrados conforme livre arbítrio do juiz, podendo ser utilizado o valor da causa como parâmetro, mas não de maneira obrigatória.
O Código de Processo Civil de 2015 (Lei Federal 13.105/2015) trouxe, em seu artigo 85, § 2º, significativa inovação em relação ao código anterior, consubstanciada na expressa indicação de outros critérios objetivos para incidência dos percentuais de 10 (dez) a 20 (vinte) por cento, tais como, além do valor da condenação, o proveito econômico obtido e o valor atualizado da causa [3].
Some-se a isso ter a legislação em comento normatizar os honorários em causas em que a Fazenda Pública for parte, conforme § 3º do artigo 85 [4].
A apreciação equitativa do Juiz ficou limitada aos casos em que a o proveito econômico for irrisório ou inestimável, ou ainda quando o valor dado à causa for muito baixo [5].
Portanto, tem-se que a apreciação equitativa não configura a regra para o arbitramento dos honorários de sucumbência, devendo ser aplicada subsidiariamente e somente nos casos citados acima.
Assim também entendeu o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial nº 1.746.072.
Em seu voto, o Ministro Raul Araújo, cujo voto prevaleceu, entendeu que “o Código de Processo Civil relegou ao parágrafo 8º do artigo 85 a instituição de regra excepcional, de aplicação subsidiária, para as hipóteses em que, havendo ou não condenação: for inestimável ou irrisório o proveito econômico obtido; ou for muito baixo o valor da causa”.
Mais adiante, enfatizou o Ministro que “a incidência, pela ordem, de uma das hipóteses do artigo 85, parágrafo 2º, impede que o julgador prossiga com sua análise a fim de investigar eventual enquadramento no parágrafo 8º do mesmo dispositivo, porque a subsunção da norma ao fato já se terá esgotado.”
Dessa forma, não resta mais qualquer dúvida quanto à aplicação apenas subsidiária da equidade para arbitramento dos honorários advocatícios, devendo o julgador esgotar as possibilidades constantes dos parágrafos antecedentes do artigo 85 do Código de Processo Civil para fixar seu arbitramento.
[1] § 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:
[2] § 4o Nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas a, b e c do parágrafo anterior.
[3] § 2o Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
[4] § 3o Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2o e os seguintes percentuais:
[5] § 8o Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2o.
Empresas em recuperação podem celebrar contratos de factoring, decide Terceira Turma

Independentemente de autorização do juízo competente, as empresas em recuperação judicial podem celebrar contratos de factoring no curso do processo de reerguimento.
Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de três empresas em recuperação para reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo e afastar a restrição que lhes foi imposta em relação à celebração de contratos de fomento mercantil.
A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que os negócios sociais de empresas em recuperação judicial permanecem geridos por elas durante o processo de soerguimento, exceto se verificada alguma das causas de afastamento ou destituição legalmente previstas.
Segundo a ministra, o artigo 66 da Lei de Falência e Recuperação de Empresas (Lei 11.101/2005) impõe ao devedor certas restrições quanto à prática de atos de alienação ou oneração de bens ou direitos de seu ativo permanente, após o pedido de recuperação.
Direitos de crédito
Nancy Andrighi salientou que os bens alienados em decorrência de contratos de factoring (direitos de crédito) não integram nenhum dos subgrupos que compõem o ativo permanente da empresa, pois não podem ser enquadrados nas categorias investimentos, ativo imobilizado ou ativo diferido.
“Assim, sejam os direitos creditórios (a depender de seu vencimento) classificados como ativo circulante ou como ativo realizável a longo prazo, o fato é que, como tais rubricas não podem ser classificadas na categoria ativo permanente, a restrição à celebração de contratos de factoring por empresa em recuperação judicial não está abrangida pelo comando normativo do artigo 66 da LFRE”, ressaltou.
Para a relatora, os contratos de fomento mercantil, na medida em que propiciam sensível reforço na obtenção de capital de giro (auxiliando como fator de liquidez), podem servir como importante aliado das empresas que buscam superar a situação de crise econômico-financeira.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1783068
Fonte: STJ
STJ atualiza banco de dados da Legislação Aplicada

A Secretaria de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atualizou o banco de dados da Legislação Aplicada. As modificações, que ocorrem sempre quando há alterações nos textos normativos, tiveram início no segundo semestre do ano passado. Elas mantêm o conteúdo seguro para consulta, tanto para os usuários do STJ quanto para os usuários externos.
Com a atualização, o usuário tem acesso ao texto vigente das leis, com critério de pesquisa adaptado para o resgate dos acórdãos que tratarão das novidades legislativas quando o tema chegar ao STJ.
Destacam-se as atualizações feitas nos seguintes diplomas legais:
Estatuto da Criança e do Adolescente;
Regime Geral de Previdência Social;
Parte Geral do Código Penal;
Lei de Execução Penal.
Fonte: STJ
Sócio que se retirou da sociedade não pode ser responsabilizado por dívidas posteriores à sua saída

As sociedades empresarias, assim tratadas pelo Código Civil em seu artigo 44, II,[1] gozam de personalidade jurídica que não se confunde com a de seus sócios. Nas sociedades limitadas, a responsabilidade de cada um de seus sócios é restrita ao valor de suas quotas, na forma do artigo 1052 do Código Civil[2].
É possível, entretanto, que a Lei determine casos excepcionais em que haja desvio de finalidade ou confusão patrimonial, entre outros, que seja desconsiderada a personalidade jurídica para que determinada obrigação possa incidir em face da pessoa física do próprio sócio e, consequentemente, sobre seu patrimônio[3]. Assim, a pessoa física do sócio pode, uma vez havendo a desconsideração da personalidade jurídica, responder pelas obrigações contraídas pela sociedade limitada, nos moldes do artigo acima referido.
O sócio pode, na forma da lei e do contrato social da sociedade, transferir suas cotas a terceiros, total ou parcialmente, mas continua, por dois anos, solidariamente responsável ao sócio que o sucedeu, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio[4]. Assim, poder-se-ia concluir que o sócio que se retira da sociedade responderia pelas obrigações desta por até dois anos de sua saída, e em consequência, em caso de desconsideração de personalidade jurídica, poderia substituir a sociedade em ação judicial em face da sociedade, se presentes os requisitos da desconsideração, não havendo qualquer questionamento quanto a este tema.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar a questão através do Recurso Especial de n.º 1.537.521, entendeu que o ex-sócio não é responsável por obrigações contraídas após sua saída da empresa.
Com este entendimento, a Terceira Turma do STJ, através do Ministro Villas Bôas Cueva, entendeu que “a interpretação dos dispositivos legais transcritos[5] conduz à conclusão de que, na hipótese de cessão de cotas sociais, a responsabilidade do cedente pelo prazo de até dois anos após a averbação da modificação contratual restringe-se às obrigações sociais contraídas no período em que ele ainda ostentava a qualidade de sócio, ou seja, antes da sua retirada da sociedade”.
Em seu voto, o Ministro ainda ressaltou que “as obrigações que são objeto do processo de execução se referem a momento posterior à retirada do recorrente da sociedade, com a devida averbação, motivo pelo qual ele é parte ilegítima para responder por tal débito”.
Desta forma, vê-se que não basta, para a responsabilização do sócio que se retira da sociedade, o aspecto do lapso temporal de dois anos; deve-se verificar se os atos os quais geraram a obrigação da qual resulta a desconsideração da personalidade jurídica foram praticados quando o sócio cedente ainda pertencia à sociedade.
O entendimento acima acaba por trazer uma situação de justiça em relação às obrigações do ex-sócio que se retira da sociedade em nada contribui para que seja gerada obrigação oriunda de inadimplemento de obrigações por parte da sociedade, não ocasionando, em consequência, qualquer penalidade à pessoa física para a constituição de novas sociedades empresárias e demais obrigações em seu nome.
[1]Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
II – as sociedades;
[2]Art. 1.052. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social.
[3]Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
[4]Art. 1.003. A cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade.
Parágrafo único. Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio.
Corte Especial desafeta recurso para rediscutir Tabela Price e mantém tese de 2014

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu questão de ordem proposta pelo ministro Luis Felipe Salomão e optou por não reabrir a discussão sobre a possibilidade de exame, em recurso especial, da legalidade do emprego da Tabela Price em financiamentos. Manteve-se assim a jurisprudência firmada em 2014, a qual considerou que a questão exige reexame de provas e de cláusulas contratuais e por isso não pode ser tratada em recurso especial.
Ao acolher a questão de ordem, a Corte Especial tornou sem efeito a afetação do Recurso Especial 951.894 ao rito dos repetitivos. O recurso desafetado tratava da possibilidade de haver reexame da questão jurídica pertinente à legalidade, em abstrato, do emprego da Tabela Price, em face da proibição de capitalização de juros em intervalo inferior ao anual, conforme preceitua o artigo 4º do Decreto 22.626/33 (Lei de Usura).
A decisão foi tomada pela maioria dos ministros que compõem o colegiado, por 7 votos a 6, na sessão realizada no último dia 6.
O ministro Salomão defendeu que o tema não fosse revisto pelo STJ, por se tratar de matéria de fato que depende da produção de prova pericial na instância ordinária. Segundo ele, o que ficou decidido pelo STJ em 2014 é que, por não ser matéria “tranquila nem entre os matemáticos”, é necessária a produção de prova técnica.
Querer rediscutir o tema agora “não me parece que contribua para a estabilidade da jurisprudência”, afirmou Salomão.
Tese
A decisão da Corte Especial preserva a tese firmada no Tema 572 dos recursos repetitivos. Em dezembro de 2014, no julgamento do REsp 1.124.552, os ministros definiram que “a análise acerca da legalidade da utilização da Tabela Price – mesmo que em abstrato – passa, necessariamente, pela constatação da eventual capitalização de juros (ou incidência de juros compostos, juros sobre juros ou anatocismo), que é questão de fato e não de direito, motivo pelo qual não cabe ao Superior Tribunal de Justiça tal apreciação, em razão dos óbices contidos nas Súmulas 5 e 7 do STJ”.
Para o STJ, “em contratos cuja capitalização de juros seja vedada, é necessária a interpretação de cláusulas contratuais e a produção de prova técnica para aferir a existência da cobrança de juros não lineares, incompatíveis, portanto, com financiamentos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação antes da vigência da Lei 11.977/2009, que acrescentou o artigo 15-A à Lei 4.380/1964”.
A tese firmada destaca ainda que, “em se verificando que matérias de fato ou eminentemente técnicas foram tratadas como exclusivamente de direito, reconhece-se o cerceamento, para que seja realizada a prova pericial”.
Em razão da questão de ordem, o recurso desafetado voltou para julgamento na Quarta Turma, sob relatoria da ministra Isabel Gallotti.
As excludentes de responsabilidade da concessionária pelos acidentes ocorridos nas estradas

A prestação de serviços públicos em nosso país pode ser executada pelo Poder Público diretamente ou, por meio de concessão ou permissão, pode ser transferida ao particular, na forma do artigo 175[1] da Constituição Federal.
Ressalte-se que a concessão da prestação dos serviços públicos, na forma do referido artigo, só poderá ser efetuada através de licitação.
Igualmente, a Constituição prevê, em seu artigo 37, § 6º[2], que a responsabilidade pelos danos causados decorrentes da prestação dos serviços públicos, sejam eles prestados diretamente pelo Poder Público ou ainda pelos particulares, dispensa a prova da existência de culpa, sendo, portanto, objetiva.
Assim, não é necessário que haja a comprovação de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, daquele que presta serviços públicos, para que se ateste a responsabilidade pelos danos causados oriundos da própria prestação de serviços.
O próprio Código de Defesa do Consumidor atesta a Teoria Objetiva da responsabilidade dos prestadores de serviços[3], inclusive quanto às prestadoras de serviços públicos[4].
Entretanto, ainda que dispense a existência de culpa, a responsabilidade civil nos casos citados acima conta com excludentes que, uma vez demonstradas, afastam por completo qualquer pretensão contrária ao prestador de serviços, dentre elas a culpa exclusiva da vítima (ou consumidor) ou de terceiros, e a inexistência de defeitos na prestação dos serviços.
Com este entendimento, o Superior Tribunal de Justiça entendeu por afastar por completo a responsabilidade de concessionária de estradas e rodovias por acidente ocorrido na estrada concedida.
Ao julgar o Recurso Especial de nº 1.762.224, o Ministro Marco Aurélio Belizze manteve acórdão que, reformando sentença de primeiro grau de procedência, negou indenização a familiares de vítima que se acidentou em rodovia no estado de São Paulo.
Alegou-se que o acidente ocorrido não teria produzido o resultado trágico que vitimou o parente dos Requerentes se a via estivesse guarnecida com guard rails.
No entendimento do Ministro Relator, corroborando com o entendimento do tribunal paulista, “em outras palavras, o que poderia ter parado o veículo, impedindo-o de atravessar o canteiro central e atingido o veículo dos filhos dos autores, poderia também ter causado mais mortes”
Ou seja, a ausência do guard rail em toda a extensão da via, não pode ser tida como falha na prestação dos serviços a ensejar a responsabilidade civil da concessionária.
Mais adiante, asseverou o Ministro Relator que “embora seja desejado por todos, não há possibilidade de que uma rodovia seja absolutamente segura contra todo e qualquer tipo de acidente, sobretudo quando causado por imprudência ou imperícia de motoristas, como ocorrido na espécie.”
De fato, a decisão em comento anda em sintonia do que determina a Lei quanto às excludentes de responsabilidade.
Não se pode atribuir ao Poder Público e às concessionárias a responsabilidade por todo e qualquer evento ocorrido derivado da prestação de seus serviços, sob pena de inviabilizar a própria prestação dos serviços. A Responsabilidade Civil objetiva, em que pese dispensar a existência de culpa, não afasta a necessidade de existência de nexo causal, corroborando com a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça.
[1] Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
[2] Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte:
- 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
[3] Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
[4] Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Segunda Seção fixa em repetitivo três novas teses sobre direito bancário

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar sob o rito dos recursos repetitivos o REsp 1.639.320 e o REsp 1.639.259, ambos de relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, firmou três novas teses que consolidam entendimento sobre a validade das tarifas bancárias de inclusão de gravame eletrônico, sobre a validade da cobrança de seguro de proteção financeira, além da possibilidade ou não de descaracterização da mora na hipótese de se reconhecer a invalidade de alguma das duas cobranças anteriores.
Os temas julgados foram cadastrados sob o número 972 no sistema dos repetitivos.
Com o julgamento, voltam a tramitar 3.711 processos que, por tratarem da mesma controvérsia, estavam suspensos em todo o território nacional até definição do STJ. A definição das teses pelo tribunal vai servir de orientação às instâncias ordinárias para a solução de casos fundados na mesma questão jurídica.
As demandas que deram origem aos repetitivos questionavam a cobrança de gravame eletrônico, de seguro de proteção financeira, e afirmavam a existência de venda casada e a descaracterização da mora em contrato de arrendamento.
A discussão ficou restrita aos contratos bancários firmados em uma relação de consumo, com instituições financeiras ou equiparadas, ainda que por intermédio de correspondente bancário, celebrados a partir de 30/04/2008, data em que entrou em vigor a Resolução 3.518/2007 do Conselho Monetário Nacional – CMN. Já para os contratos celebrados em data anterior, os ministros não identificaram multiplicidade de recursos para justificar a fixação da tese pelo rito dos repetitivos.
Pré-gravame
A primeira tese fixada dispõe: “abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Resolução-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva”.
De acordo com o ministro, a despesa de pré-gravame é uma despesa com serviço prestado por terceiro, cobrada do consumidor a título de ressarcimento de despesa, sendo um registro adicional, alimentado pelas instituições financeiras com o objetivo de conferir maior segurança e agilidade às contratações.
Ele afirmou que, com a entrada em vigor da Resolução-CMN 3.954/2011, foi restringida a cobrança de valores referentes a ressarcimento de serviços prestados por terceiros ou qualquer outra forma de remuneração pelo fornecimento de produtos ou serviços de responsabilidade da instituição financeira. Nesse sentido, verificou-se a necessidade de consolidar uma tese para limitar a validade do ressarcimento apenas se o contrato tiver sido firmado até 25/02/2011.
Seguro de proteção financeira
A segunda tese diz que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”.
Segundo Sanseverino, nesse seguro oferece-se uma cobertura adicional, referente a uma possível despedida involuntária do segurado que possui vínculo empregatício, ou perda de renda para o segurado autônomo, além da cobertura para os eventos morte e invalidez do segurado.
O ministro esclareceu que a inclusão desse seguro nos contratos bancários não é proibida pela regulação bancária, “até porque não se trata de um serviço financeiro”, porém “configura venda casada a prática das instituições financeiras de impor ao consumidor a contratação com determinada seguradora”.
Encargos acessórios
Já a terceira tese fixada determina que “a abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora”.
Conforme explicou o relator dos repetitivos, os encargos que descaracterizam a mora seriam principalmente os juros remuneratórios e capitalização, “encargos essenciais dos contratos de mútuo bancário”.
Por isso, “a abusividade em algum encargo acessório do contrato não contamina a parte principal da contratação”, concluiu.
Recursos repetitivos
O novo Código de Processo Civil regula a partir do artigo 1.036 o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas. Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.
A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.
No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como saber a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações.
Leia o acórdão.
REsp 1639320
REsp 1639259
Fonte: STJ
STJ atualiza tabela de custas judiciais

Passou a vigorar no dia 01/02/2019 a Instrução Normativa STJ/GP 2/2019, que estabelece novos valores das custas judiciais nos processos de competência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A atualização da tabela segue a regra prevista na Lei 11.636/2007, que institui a correção anual desses valores de acordo com o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
O novo regulamento não modifica as regras da Resolução STJ/GP 2/2017. As alterações estão restritas à revisão da tabela de custas judiciais e porte de remessa e retorno dos autos.
Como pagar
As custas processuais – da mesma forma como o porte, quando necessário – devem ser pagas exclusivamente por meio da Guia de Recolhimento da União (GRU Cobrança), emitida após o preenchimento de formulário eletrônico disponível no site do STJ.
Desde 2017, o usuário pode gerar a GRU Cobrança no próprio site do tribunal. Além de oferecer mais segurança, o sistema permite a reimpressão do boleto, o pagamento em dobro (nos casos em que não for comprovado, no ato de interposição do recurso, o recolhimento do preparo – artigo 1.007, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil) e a geração de guia complementar.
No caso de ações originárias (ajuizadas diretamente no STJ), o comprovante de recolhimento e a guia das custas devem ser apresentados no ato do protocolo. Já quando se tratar de recurso, o recolhimento será feito perante o tribunal de origem, e os comprovantes e as guias deverão ser apresentados no ato da interposição.
O Espaço do Advogado fornece mais informações sobre pagamento de despesas judiciais e dá acesso à geração da GRU Cobrança. Em caso de dúvida, o usuário ainda pode entrar em contato com o Atendimento Judicial do STJ pelo telefone (61) 3319-8410, das 9h às 19h, ou pelo e-mail [email protected].
Fonte: STJ
Espólio de consignante deve responder por dívida, que não se extingue com o falecimento

É comum em nossa sociedade que pessoas contraiam empréstimos junto às instituições financeiras para sanar dívidas, pagar novas despesas ou mesmo realizar sonhos.
Também é comum que pessoas, em especial aquelas cujos vencimentos sejam depositados em conta bancária, autorizem o débito das prestações dos valores obtidos por empréstimos diretamente nestas contas, em dias previamente informados. Tal medida pode, em alguns casos, inclusive reduzir a taxa de juros dos empréstimos, pois, em tese, representariam uma diminuição do risco de inadimplência.
Mais reduzido ainda é o risco (e, por conseguinte, os juros) quando o empréstimo pode ser debitado diretamente da folha de pagamento do mutuário, pois prescinde inclusive de saldo positivo na conta bancária deste.
Ocorre que, em alguns casos, o mutuário falece ainda com prestações dos empréstimos a vencer, sendo certo que, como o falecimento, extingue-se o contrato de trabalho e, por conseguinte, o recebimento de proventos e sua retirada da “folha de pagamento”.
E aí vem a questão: a dívida extingue-se com a morte?
A Lei Federal 1.046/50 permitiu que empréstimos em dinheiro fossem consignados em folha de pagamento. Em princípio, poderiam consignar em folha aqueles constantes do rol do artigo 4º[1] da referida Lei, sendo, essencialmente, militares e servidores públicos.
Em seu artigo 16[2], a Lei previa que a dívida do empréstimo feito mediante simples garantia da consignação em folha ficaria extinta com o falecimento do Consignante.
Já a Lei Federal 10.820/03 tratou da consignação em folha dos trabalhadores regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho.
Assim, e alegando afronta ao artigo 16 da Lei 1.046/50, herdeiros de um consignante falecido interpuseram Recurso Especial em face de acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Grande do Sul que, reformando a sentença de primeiro grau, entendeu que a morte do consignante não extinguia a dívida, por entender que a herança responde pela dívida. O Recurso Especial recebeu o número 1.753.135 e coube à Ministra Nancy Andrigui a sua relatoria.
Em seu voto, seguido à unanimidade pelos demais ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, a Ministra, conhecendo em parte o Recurso Especial e, nesta parte, desprovendo-o, entendeu acertado o entendimento manifestado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
Em seu voto, a Ministra Nancy Andrigui destacou que “configura-se, pois, a ab-rogação tácita ou indireta da Lei 1.046/50 na medida em que a Lei 8.112/90 tratou, inteiramente, da matéria contida naquela, afastando a sua vigência no ordenamento jurídico. Não havendo na lei revogadora previsão semelhante à do artigo 16 da Lei 1.046/50, não há falar, a partir da entrada em vigor da Lei 8.112/90, em extinção da dívida por morte do consignante”.
Assim, ainda que houvesse discussão quanto a ser o consignante estatutário ou celetista, o artigo 16 da Lei Federal 1.046/50 já estaria revogado no entendimento da Ministra Relatora.
Parece-nos acertada a decisão do Superior Tribunal de Justiça.
A dívida, não garantida por seguro prestamista, não se extingue, por si só, com o falecimento do devedor. Responderá o espólio, até seus limites, pelos valores devidos, ou, em caso de já terminada a transferência dos bens aos herdeiros, estes respondem até o limite do que receberam como, aliás, já pacificado pelo próprio STJ (e-STJ fl. 237).
[1]Art. 4º Poderão consignar em fôlha: (Vide Lei nº 5.725, de 1971)
I – Funcionários públicos ou extranumerários, mensalistas, diaristas, contratados e tarefeiros;
II – Militares do Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Distrito Federal;
III – Juízes, membros do Ministério Público e serventuários da Justiça;
IV – Senadores e Deputados;
V – Servidos e segurados ou associados de autarquias, sociedades de economia mista, ernprêsas concessionárias de serviços de utilidade pública, ou inucorporada ao patrimônio público;
VI – Associados e servidores de cooperativas de consumo, com fins beneficentes, legalmente constituídas;
VII – Servidores civis aposentados, e militares reformados, ou da reserva remunerada;
VIII – Pensionistas civis e militares.
[2] Art. 16. Ocorrido o falecimento do consignante, ficará extinta a dívida do empréstimo feito mediante simples garantia da consignação em fôlha.