Sobre parcela vincenda incidem juros a partir do vencimento da própria parcela

Ministro Villas Bôas Cueva


Versa o artigo de hoje sobre o termo inicial de incidência dos juros moratórios no que diz respeito às parcelas vincendas oriundas de determinada obrigação.

Na forma do artigo 323 do Código de Processo Civil, nas ações que tenham por objeto o cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, estas serão consideradas incluídas no pedido e serão incluídas também na condenação, enquanto durar a obrigação, se no curso do processo o devedor deixar de pagá-las[1].

Também prevê o artigo 405 do Código Civil que os juros de mora contam-se a partir da citação[2].

Desta forma, corroborando com a letra da lei, e como se encontra pacificado na jurisprudência de nossos Tribunais Superiores, os juros de mora em obrigações contratuais incidem a partir da citação.

De acordo com tese firmada em sede de Recursos Repetitivos perante o Superior Tribunal de Justiça, mais precisamente nos temas 658, 659 e 741, “sobre o valor dos dividendos não pagos, incide correção monetária desde a data de vencimento da obrigação, nos termos do artigo 205, parágrafo 3º, da Lei 6.404/1976, e juros de mora desde a citação”.

Baseado nas premissas acima, ingressou a recorrente com Recurso Especial em face de Acórdão que negou provimento a Agravo de Instrumento interposto de decisão em fase de execução que acabou por não acolher tese de excesso de execução, que se consubstanciava justamente no fato de que não poderia incorrer juros sobre parcela que sequer existia à época da citação no processo de conhecimento, e que, por conseguinte, sequer seria exigível ou mesmo pudesse ser considerada inadimplida.

O Recurso Especial admitido tomou o número 1.601.739, sendo distribuído à relatoria do Ministro Villas Bôas Cueva.

Em seu voto, o Ministro inicialmente tratou de estabelecer a diferença entre a hipótese dos autos e aquela tratada por força da tese firmada nos temas 658, 659 e 741, em que ressaltou o relator que “estará a deliberar acerca de uma situação específica e excepcional (termo inicial dos juros moratórios decorrentes da obrigação de pagar dividendos convertida em perdas e danos sobre as parcelas vincendas posteriores à citação), cuja minúcia não estava em questão naquela assentada e sobre ela não se debruçou o colegiado maior de Direito Privado.”

Desta forma, prosseguiu o Relator com seu entendimento acerca do tema, ressaltando que “as parcelas que passaram a ser devidas a partir do período compreendido entre a data da citação e a do trânsito em julgado (denominadas vincendas pela recorrente) devem observar as datas dos respectivos vencimentos para que possa ter início o cômputo dos juros de mora, pois é desse momento em diante que elas passam a ser exigíveis e, uma vez não pagas, vencidas”.

Nos parece absolutamente adequada a posição do Relator, uma vez que não se poderia considerar em mora o devedor quanto às parcelas que sequer estariam vencidas quando da citação, unicamente porque sequer existiam.

Sobre este ponto, muito bem colocou o Ministro Relator quando aduz que não há como se exigir da parte recorrente, por exemplo, o pagamento de dividendos relativos ao exercício de 2007, devidos a partir de 16/4/2008, computando-se juros de mora desde a citação, realizada em 14/3/2006, ou seja, mais de 2 (dois) anos antes do vencimento da obrigação”.

Por fim, concluiu o Ministro Villas Bôas Cueva que ”os juros moratórios devem ter incidência a partir do vencimento de cada parcela que se originar posteriormente à data da citação (denominadas vincendas), pois é somente a partir desse termo que essas rubricas passam a ter exigibilidade e, com isso, materializa-se a mora do devedor, a qual não existia na data da citação. Aplica-se, no ponto, por especialidade, a regra do art. 396 do Código Civil de 2002, segundo o qual, ‘Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em mora’”.

Denota-se, portanto, o brilhantismo e a correção dos argumentos da decisão ora examinada, eis que não aplica, através do distiguishing, o entendimento firmado em sede de recursos repetitivos por não ser ele o adequado à solução do caso concreto e acerta ao determinar que uma obrigação encontra-se inadimplida apenas após a sua data de vencimento, não podendo sobre esta, antes disso incidir juros de mora.


[1]Art. 323. Na ação que tiver por objeto cumprimento de obrigação em prestações sucessivas, essas serão consideradas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor, e serão incluídas na condenação, enquanto durar a obrigação, se o devedor, no curso do processo, deixar de pagá-las ou de consigná-las.

[2] Art. 405. Contam-se os juros de mora desde a citação inicial.

 


Cabe agravo de instrumento contra decisões proferidas durante processo de recuperação e falência

Ministro Villas Bôas Cueva


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que as hipóteses legais de cabimento do agravo de instrumento elencadas no parágrafo único do artigo 1.015 do Código de Processo Civil de 2015 devem ser interpretadas extensivamente, englobando também a recuperação judicial e a falência. Dessa forma, o colegiado deu provimento a um recurso especial para admitir a interposição de agravo de instrumento contra decisão proferida após a sentença de habilitação de crédito.

De acordo com os autos, os recorrentes pediram a habilitação de seus créditos na recuperação judicial de uma empresa de transporte – o primeiro relativo a indenização de danos originados em acidente de trânsito e o segundo decorrente dos honorários de sucumbência fixados na ação indenizatória.

O advogado pediu prioridade de pagamento alegando que, devido a um grave problema de saúde, seu crédito deveria se sobrepor ao dos credores trabalhistas, os quais já estavam recebendo os valores devidos em razão de acordo judicial.

Após o indeferimento do pedido, o advogado interpôs agravo de instrumento, que não foi conhecido pelo Tribunal de Justiça de Sergipe, ao entendimento de que não haveria previsão no rol taxativo do artigo 1.015 do CPC.

Sistema recursal

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, explicou que a Lei de Falência e Recuperação de Empresas (LFRE) tem normas de direito material e processual, instituindo um regime recursal próprio. “Prevê, em linhas gerais, que contra as sentenças cabe agravo de instrumento e contra decisões interlocutórias cabe apelação”, disse.

O ministro esclareceu que contra a sentença que decreta a falência cabe agravo de instrumento, o qual não tem efeito suspensivo, permitindo que, pelo princípio da celeridade, seja iniciada a realização do ativo, como forma de evitar a desvalorização dos bens. Nessas hipóteses, a concessão de efeito suspensivo passa a ser excepcional, dependendo de decisão do relator do recurso.

“Tal regramento próprio, porém, não é exaustivo, prevendo o artigo 189 da LFRE a aplicação do Código de Processo Civil ‘no que couber’. A utilização desse termo indica que a aplicação da lei adjetiva somente se dará quando a lei especial não regular o tema e com ela não for incompatível”, ressaltou.

Recuperação judicial

Em seu voto, o relator destacou que as questões interlocutórias proferidas durante o processamento da recuperação judicial e da falência – não enquadradas nos incisos do artigo 1.015 do CPC – não poderão ser revistas em eventual apelação, conforme estabelece o artigo 1.009, parágrafo 1°, do CPC.

Segundo Villas Bôas Cueva, as sentenças previstas na LFRE são as que encerram a recuperação judicial (artigo 63), decretam a falência (artigo 99), julgam improcedente o pedido de falência (artigo 100), julgam as contas do administrador (artigo 154, parágrafo 4°), encerram a falência e extinguem as obrigações (artigos 154 e 156). A primeira é objeto de agravo de instrumento, enquanto as demais são proferidas em fases processuais nas quais os atos de recuperação e falência já produziram efeitos.

“Observa-se, portanto, que na forma como a LFRE está estruturada, é necessário que as decisões interlocutórias sejam decididas desde logo. A recuperação judicial não é um processo em que há uma sucessão ordenada de atos que termina na sentença. Na realidade, a recuperação judicial busca coordenar o interesse dos credores e do devedor, a partir da realização de diversos atos paralelos, que ao final serão alinhados para possibilitar a votação do plano e sua eventual aprovação ou a decretação da quebra. Assim, questões surgidas nas fases postulatória e deliberativa não podem aguardar a sentença de encerramento”, ressaltou.

O ministro concluiu que as disposições do parágrafo único do artigo 1.015 do CPC devem ser interpretadas ampliativamente, “englobando a recuperação judicial e a falência, que, na parte recursal, em tudo se assemelham aos casos ali descritos, de modo que seja possível a interposição de agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias proferidas durante sua tramitação”.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1786524

Fonte: STJ


Magistrado não pode indeferir gratuidade de Justiça sem abrir prazo para comprovação de hipossuficiência

Ministro Villas Bôas Cueva


Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a assistência jurídica gratuita só poderá ser negada pelo magistrado se houver elementos nos autos que indiquem a falta de critérios legais para a concessão do benefício, e apenas depois de intimado o requerente para comprovar a alegada hipossuficiência, conforme previsto nos artigos 98 e 99caput, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015).

O caso analisado pelo colegiado diz respeito a um pedido de gratuidade de Justiça que foi indeferido sem que tenha sido aberto prazo para a empresa solicitante comprovar a alegada hipossuficiência financeira.

O processo teve origem em ação monitória julgada improcedente em primeira instância. Depois disso, a empresa autora da ação apresentou recurso, acompanhado do pedido de assistência jurídica gratuita.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou a gratuidade por entender que não houve a comprovação da necessidade do benefício. De acordo com o tribunal paulista, a recorrente só apresentou uma declaração assinada por contabilista que trabalha para ela. Para o TJSP, a declaração não tem fé pública e não vale como comprovação sem outro documento que corrobore a informação ali indicada.

Sob o fundamento de limitar as situações nas quais o pedido de gratuidade é utilizado pela parte apenas para não recolher as custas no momento oportuno, o TJSP determinou o recolhimento em dobro.

Hipossuficiência

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, frisou que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos”, como previsto no artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal. O ministro também lembrou que o CPC/2015 foi responsável por definir os critérios para concessão dessa assistência.

Villas Bôas Cueva disse que, legalmente, a pessoa que não tem recursos para pagar pelas custas processuais e pelos honorários advocatícios é classificada como hipossuficiente e tem, portanto, direito ao benefício. Salientou também que a assistência gratuita pode ser solicitada a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, conforme previsto no CPC.

“Ao analisar o requerimento da gratuidade, o magistrado somente poderá rejeitá-lo com base em elementos contidos nos autos contrários à pretensão”, destacou o relator no seu voto.

Segundo o ministro, a decisão do TJSP não apontou explicitamente um documento que ateste a condição financeira da requerente; apenas citou que uma declaração apresentada por ela não validaria a alegada hipossuficiência.

Villas Bôas Cueva afirmou que não cabe ao juiz indeferir de plano o pedido, devendo intimar a parte interessada para comprovar a situação financeira. Se o magistrado, após esse procedimento, negar o pedido de gratuidade, o requerente deverá ser intimado para realizar o preparo de forma simples.

“No caso, a Corte local, antes de indeferir o pedido de gratuidade de Justiça, deveria ter intimado a recorrente para comprovar a sua incapacidade de arcar com os custos da apelação. Ademais, ainda que negado o referido benefício, o preparo deveria ter sido realizado na forma simples”, concluiu o ministro.

Por unanimidade, o colegiado do STJ determinou a intimação da recorrente para que apresente ao TJSP documentos que comprovem a alegada hipossuficiência financeira. Em caso de indeferimento do pedido, o tribunal paulista deverá permitir o recolhimento do preparo na forma simples.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1787491

Fonte: STJ


A possibilidade de se dividir em subclasses os credores da Recuperação Judicial

Ministro Villas Bôas Cueva


De acordo com a Lei Federal 11.101/05, quando do requerimento de Recuperação Judicial por parte de uma sociedade empresária, seus credores são divididos em classes, de acordo com a natureza de seus créditos.

Ademais,
tal divisão se faz necessária para efeitos de participação e voto na
assembleia-geral de credores, que definirá a aprovação do Plano de Recuperação
Judicial, a escolha do Comitê de Credores, eventual pedido de desistência de
algum devedor, nomeará o gestor judicial e qualquer outra matéria que possa
interferir ou afetar os interesses dos credores [1].

Na
forma da legislação acima citada, a Assembleia-geral de Credores será composta
pelas seguintes classes de credores, conforme o artigo 41:

 Art.
41. A assembleia-geral será composta pelas seguintes classes de credores:

I –
titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de
acidentes de trabalho;

             II
– titulares de créditos com garantia real;

 III – titulares de créditos
quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados.

IV – titulares de créditos enquadrados
como microempresa ou empresa de pequeno porte
.

Estas
são, portanto, as classes de credores previstas em lei. Entretanto, e por
particularidades existentes em cada Recuperação Judicial, alguns credores da
mesma classe podem apresentar interesses homogêneos entre si, mas não comuns a
todos aqueles integrantes da referida classe, ou ainda ser diferenciados pela
sua relevância no próprio funcionamento da empresa recuperanda, possibilitando
inclusive a própria recuperação.

Entretanto,
seja qual for o critério utilizado, é necessário que este se apresente de forma
objetiva, e seja aprovado diante da assembleia-geral de credores, cujo
resultado, se não eivado de nulidade, é soberano. E, ainda, que todos os
credores de uma determinada classe tenham tratamento igualitário, desde que
tenham interesses homogêneos [2].

Neste
sentido, o Superior Tribunal de Justiça enfrentou a questão acima proposta,
através do julgamento do Recurso Especial n.º 1.634.844/SP, distribuído para a
Terceira Turma, e cuja relatoria coube ao Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

Em sua
decisão, acompanhada por unanimidade pelos demais integrantes da Terceira Turma
do Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Villas Bôas Cueva salienou
que “em regra, a deliberação da assembleia de credores é soberana,
reconhecendo-se aos credores, diante da apresentação de laudo
econômico-financeiro e de demonstrativos e pareceres acerca da viabilidade da
empresa, o poder 
de decidir pela conveniência de se submeter
ao plano de recuperação judicial ou pela realização do ativo com a decretação
da quebra, o que decorre da rejeição da proposta.”

O
Ministro desenvolve seu voto salientando que mesmo dentro de uma classe de
credores como a quirografária, podem haver credores financeiros, fornecedores
em geral, fornecedores dos quais depende a continuidade da atividade econômica
da recuperanda, credores eventuais, entre outros.

Assim,
no caso em comento, asseverou o Ministro Villas Bôas Cueva que “escolhido um critério, todos os credores que possuam
interesses homogêneos serão agrupados sob essa subclasse, devendo ficar
expresso o motivo pelo qual o tratamento diferenciado desse grupo se justifica
e favorece a recuperação judicial, possibilitando o controle acerca da
legalidade do parâmetro estabelecido
”.

Por fim, o Ministro concluiu que “…é
possível a criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial,
desde que estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de
recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando
vedada a anulação de direitos de eventuais credores isolados”.

Com
esse entendimento, acreditamos que o Superior Tribunal de Justiça possa dar
ainda mais força a determinados credores quirografários que, ainda que
pertencente a uma única classe de credores, podem apresentar interesses
diversos daqueles pela peculiaridade de suas atividades, inclusive para a
efetiva recuperação da empresa recuperanda.

Mas,
como ressaltou o Ministro Relator, a objetividade na escolha do critério para a
criação da subclasse é requisito essencial para a sua validade, uma vez que eventual
critério objetivo poderia causar dúvidas e dar margem à interpretação,
culminando com a violação do tratamento igualitário que deve nortear o
procedimento de recuperação judicial.


[1] Art.
35. A assembléia-geral de credores terá por atribuições deliberar sobre:

       
I – na recuperação judicial:

       
a) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial
apresentado pelo devedor;

       
b) a constituição do Comitê de Credores, a escolha de seus membros e sua
substituição;

       
c) (VETADO)

       
d) o pedido de desistência do devedor, nos termos do § 4o do
art. 52 desta Lei;

       
e) o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor;

       
f) qualquer outra matéria que possa afetar os interesses dos credores;

[2] “O plano de recuperação judicial
deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores
que possuem interesses homogêneos, sejam estes delineados em função da natureza
do crédito, da importância do crédito ou e outro critério de similitude
justificado pelo proponente do plano homologado pelo magistrado.”
 Enunciado
nº 57 da I Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal


Acordo celebrado após o deferimento de Recuperação Judicial não pode ser executado nos autos da recuperação

Ministro Villas Bôas Cueva


A Recuperação Judicial foi instituída em nosso ordenamento jurídico através da Lei Federal 11.101, de 09 de Fevereiro de 2005, para possibilitar àquelas empresas que se encontram em situação financeira precária e com diversas dívidas que sigam desenvolvendo sua atividade empresarial e, assim, tenham a possibilidade de saldar seus compromissos [1].

Na forma do seu artigo 6º, o deferimento da Recuperação Judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas de credores particulares do sócio solidário.

Estes créditos serão processados perante o Juízo competente para promover a Recuperação Judicial da empresa, sendo ele competente para processar e julgar as ações sobre bens, interesses e negócios da Recuperanda, sendo o chamado Juízo Universal [2].

Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos [3].

Ou seja, de acordo com a redação acima, transcrita diretamente da Lei Federal citada, os créditos e dívidas posteriores ao pedido de recuperação estarão fora do plano de recuperação, e deverão prosseguir de forma autônoma.

Sendo assim, um acordo firmado posteriormente ao pedido da Recuperação Judicial, pela regra citada, estaria excluído do procedimento e, por conseguinte, não atrairia a competência do Juízo Universal, podendo ser executado na Vara competente.

Através do julgamento do Recurso Especial n.º 1.766.413, o Superior Tribunal de Justiça manifestou o entendimento de que não são da competência do Juízo Universal a homologação e fiscalização do Acordo celebrado após o pedido de Recuperação Judicial.

Em seu voto, o Ministro Villas Bôas Cueva, relator do processo e integrante da Terceira turma do Superior Tribunal de Justiça, enfatizou que “O fato de a LFRE conferir ao administrador judicial atividade fiscalizatória não significa que lhe cabe se imiscuir no mérito dos atos negociais, mas, sim, que deve acompanhar o andamento da recuperação judicial, verificando o cumprimento do plano e eventuais ilegalidades”.

Mais adiante, em relação à alegação da Recorrente de que os valores constantes do acordo poderiam ser utilizados no pagamento dos credores, o Ministro aduziu que “a referida quantia não está prevista no plano de recuperação judicial, na justa medida em que o contrato foi assinado em momento posterior, evidenciando a ausência de interferência no andamento da recuperação”.

Desta forma entende-se que o julgado deu cumprimento ao artigo 49 da Lei de Recuperação Judicial e Falências, pois excluiu do objeto da Recuperação Judicial o crédito posterior ao pedido feito pela empresa.

Deve-se destacar, entretanto, que, como asseverou o Ministro Relator, o Juízo Universal deve fiscalizar os atos realizados pela empresa em Recuperação Judicial, intervindo naqueles em que se pode, em verdade, subverter o próprio objeto da Recuperação Judicial, colocando em risco o pagamento aos credores ali habilitados.


[1]Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

[2] Art. 76. O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo.

[3] Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.


Autor da ação renovatória deve pagar os alugueis devidos ainda que renuncie ao direito à renovação

Ministro Villas Bôas Cueva


A Ação Renovatória está prevista em nosso ordenamento jurídico nos artigos 71 e seguintes da Lei Federal nº 8.245/91.

Seus requisitos estão descritos nos referidos artigos, destacando-se:

  • Estar em dia com a locação e os encargos locatícios;
  • O Contrato a renovar ter sido celebrado por prazo determinado;
  • O prazo mínimo do contrato a renovar ou a soma dos prazos ininterruptos dos contratos escritos ser de 5 (cinco) anos;
  • Ingressar com a ação renovatória no interregno de 1 (um) ano, no máximo, até 6 (seis) meses, no mínimo, anteriores à data de finalização do prazo do contrato em vigor.

 

Desta forma, preenchidos os requisitos acima, dentre outros, poderá o Locatário requerer a renovação da locação por igual período, não podendo o Locador simplesmente não concordar ou não aceitar a renovação da locação.

 

Não é incomum que alguns locatários, após ingressarem com as respectivas ações renovatórias, não desejem mais discutir a referida renovação, seja por força de uma decisão financeira ou mesmo por entender que haveria algum insucesso na demanda.

 

A renúncia ao direito no qual se funda a ação é possível por parte do Autor na ação renovatória, sendo o processo extinto com resolução do mérito na forma do artigo 487, V, do Código de Processo Civil. Com a homologação da renúncia, o Autor não pode mais discutir nem pleitear a renovação do contrato de locação nas mesmas condições do contrato que se desejava renovar, podendo, entretanto, fazê-lo em novas condições tratadas com o Locador.

 

A questão é: poderia juiz homologar um pedido de renúncia do autor ao direito no qual se funda ação, após proferida sentença de improcedência e, se positiva, quais seriam as consequências quanto ao pagamento dos alugueis e encargos discutidos na demanda.

 

Ao julgar o Recurso Especial nº 1.707.365, o Ministro Villas Bôas Cueva, entendeu ser possível o acolhimento do pedido de renúncia do autor da ação, reformando entendimento manifestado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais.

 

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, após sentença de improcedência em ação renovatória, entendeu não ser possível acolher o pedido de renúncia do autor quanto ao direito discutido, pelo fato de que, em sua análise, já teria transcorrido o prazo do objeto constante da demanda renovatória.

 

Além disso, entendeu o tribunal local que estava em jogo, também, o valor proposto pelo Locador para o novo período de locação a ser renovado, como previsto no artigo 72 da Lei de Locações[1]. Por tais motivos, a renúncia não foi homologada.

 

Manejado o Recurso Especial, o Ministro Relator ponderou que a renúncia “é ato unilateral, no qual o autor dispõe da pretensão de direito material, podendo ser apresentada até o trânsito em julgado da demanda”. Ou seja, é possível a homologação da renúncia mesmo após a sentença de improcedência, operando desde já o trânsito em julgado. E ressaltou o Ministro ainda, quanto ao período de ocupação do imóvel durante a discussão traçada na Ação Renovatória, que fossem pagos os alugueis em vigor até a efetiva desocupação.

 

No caso em comento, com a sentença de improcedência dos pedidos, ainda houve o comando para expedição de Mandado de Despejo para ser efetivado em 30 (trinta dias), tendo em vista a ausência de renovação da locação.

 

Por certo, e acreditamos que não paire quaisquer dúvidas sobre isso, são devidos aluguéis pelo período em que o imóvel permaneceu ocupado pelo Locatário por força da locação objeto do litígio.

 

Entretanto, andou bem a decisão do Superior Tribunal de Justiça que não só reconhece a obrigatoriedade do pagamento dos aluguéis mesmo com a homologação da renúncia ao direito ao qual se funda a ação, mas também autorizou a cobrança destes alugueis na própria Ação Renovatória, dando efetividade ao direito do Locador em receber os valores locatícios.

 

O Relator ressaltou que essa decisão não exime a locatária de cumprir a obrigação de deixar o imóvel e efetuar o pagamento dos aluguéis devidos até a data da efetiva desocupação.

 

Assim, entendemos correta a aposição do Superior Tribunal de Justiça, conferindo celeridade e segurança jurídica ao tema proposto.

 


[1] Art. 72. A contestação do locador, além da defesa de direito que possa caber, ficará adstrita, quanto à matéria de fato, ao seguinte:

I – não preencher o autor os requisitos estabelecidos nesta lei;

II – não atender, a proposta do locatário, o valor locativo real do imóvel na época da renovação, excluída a valorização trazida por aquele ao ponto ou lugar;

III – ter proposta de terceiro para a locação, em condições melhores;

IV – não estar obrigado a renovar a locação (incisos I e II do art. 52).

  • 1º No caso do inciso II, o locador deverá apresentar, em contraproposta, as condições de locação que repute compatíveis com o valor locativo real e atual do imóvel.
  • 2º No caso do inciso III, o locador deverá juntar prova documental da proposta do terceiro, subscrita por este e por duas     testemunhas, com clara indicação do ramo a ser explorado, que não poderá ser o mesmo do locatário. Nessa hipótese, o locatário poderá, em réplica, aceitar tais condições para obter a renovação pretendida.
  • 3º No caso do inciso I do art. 52, a contestação deverá trazer prova da determinação do Poder Público ou relatório pormenorizado das obras a serem realizadas e da estimativa de valorização que sofrerá o imóvel, assinado por engenheiro devidamente habilitado.
  • 4º Na contestação, o locador, ou sublocador, poderá pedir, ainda, a fixação de aluguel provisório, para vigorar a partir do primeiro mês do prazo do contrato a ser renovado, não excedente a oitenta por cento do pedido, desde que apresentados elementos hábeis para aferição do justo valor do aluguel.
  • 5º Se pedido pelo locador, ou sublocador, a sentença poderá estabelecer periodicidade de reajustamento do aluguel diversa daquela prevista no contrato renovando, bem como adotar outro indexador para reajustamento do aluguel.