STF decide que cumprimento da pena deve começar após esgotamento de recursos
Por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é constitucional a regra do Código de Processo Penal (CPP) que prevê o esgotamento de todas as possibilidades de recurso (trânsito em julgado da condenação) para o início do cumprimento da pena. Nesta quinta-feira (7), a Corte concluiu o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) 43, 44 e 54, que foram julgadas procedentes.
Votaram a favor desse entendimento os ministros Marco Aurélio (relator), Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli, presidente do STF. Para a corrente vencedora, o artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), segundo o qual “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”, está de acordo com o princípio da presunção de inocência, garantia prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal. Ficaram vencidos os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia, que entendiam que a execução da pena após a condenação em segunda instância não viola o princípio da presunção de inocência.
A decisão não veda a prisão antes do esgotamento dos recursos, mas estabelece a necessidade de que a situação do réu seja individualizada, com a demonstração da existência dos requisitos para a prisão preventiva previstos no artigo 312 do CPP – para a garantia da ordem pública e econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.
O julgamento das ADCs foi iniciado em 17/10 com a leitura do relatório do ministro Marco Aurélio e retomado em 23/10, com as manifestações das partes, o voto do relator e os votos dos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. Na sessão de 24/10, o julgamento prosseguiu com os votos dos ministros Rosa Weber, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski. Na sessão de hoje, proferiram seus votos a ministra Cármen Lúcia e os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli.
Ministra Cármen Lúcia
A ministra aderiu à divergência aberta na sessão de 23/10 pelo ministro Alexandre de Moraes, ao afirmar que a possibilidade da execução da pena com o encerramento do julgamento nas instâncias ordinárias não atinge o princípio da presunção de inocência. Segundo ela, o inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal deve ser interpretado em harmonia com os demais dispositivos constitucionais que tratam da prisão, como os incisos LIV (devido processo legal) e LXI (prisão em flagrante delito ou por ordem escrita).
A eficácia do direito penal, na compreensão da ministra, se dá em razão da certeza do cumprimento das penas. Sem essa certeza, “o que impera é a crença da impunidade”. A eficácia do sistema criminal, no entanto, deve resguardar “a imprescindibilidade do devido processo legal e a insuperável observância do princípio do contraditório e das garantias da defesa”.
Ministro Gilmar Mendes
Em voto pela constitucionalidade do artigo 283 do CPP, o ministro Gilmar Mendes afirmou que, após a decisão do STF, em 2016, que passou a autorizar a execução da pena antes do trânsito em julgado, os tribunais passaram a entender que o procedimento seria automático e obrigatório. Segundo o ministro, a decretação automática da prisão sem que haja a devida especificação e individualização do caso concreto é uma distorção do que foi julgado pelo STF.
Para Mendes, a execução antecipada da pena sem a demonstração dos requisitos para a prisão viola o princípio constitucional da não culpabilidade. Ele salientou que, nos últimos anos, o Congresso Nacional aprovou alterações no CPP com o objetivo de adequar seu texto aos princípios da Constituição de 1988, entre eles o da presunção de inocência.
Ministro Celso de Mello
Ao acompanhar o relator, o ministro afirmou que nenhum juiz do STF discorda da necessidade de repudiar e reprimir todas as modalidades de crime praticadas por agentes públicos e empresários delinquentes. Por isso, considera infundada a interpretação de que a defesa do princípio da presunção de inocência pode obstruir as atividades investigatórias e persecutórias do Estado. Segundo ele, a repressão a crimes não pode desrespeitar e transgredir a ordem jurídica e os direitos e garantias fundamentais dos investigados. O decano destacou ainda que a Constituição não pode se submeter à vontade dos poderes constituídos nem o Poder Judiciário embasar suas decisões no clamor público.
O ministro ressaltou que sua posição em favor do trânsito em julgado da sentença condenatória é a mesma há 30 anos, desde que passou a integrar o STF. Ressaltou ainda que a exigência do trânsito em julgado não impede a decretação da prisão cautelar em suas diversas modalidades.
Leia a íntegra do voto do ministro Celso de Mello.
Ministro Dias Toffoli
Último a votar, o presidente do STF explicou que o julgamento diz respeito a uma análise abstrata da constitucionalidade do artigo 283 do CPP, sem relação direta com nenhum caso concreto. Para Toffoli, a prisão com fundamento unicamente em condenação penal só pode ser decretada após esgotadas todas as possibilidades de recurso. Esse entendimento, explicou, decorre da opção expressa do legislador e se mostra compatível com o princípio constitucional da presunção de inocência. Segundo ele, o Parlamento tem autonomia para alterar esse dispositivo e definir o momento da prisão.
Para o ministro, a única exceção é a sentença proferida pelo Tribunal do Júri, que, de acordo com a Constituição, é soberano em suas decisões. Toffoli ressaltou ainda que a exigência do trânsito em julgado não levará à impunidade, pois o sistema judicial tem mecanismos para coibir abusos nos recursos com a finalidade única de obter a prescrição da pena.
Fonte: STF
Efeitos da desconsideração inversa da personalidade jurídica devem ser mantidos até a extinção da execução
Em nosso ordenamento jurídico, é possível a desconsideração da personalidade jurídica com a finalidade de garantir o cumprimento das obrigações e execução dos títulos executivos, na forma do que preceitua o artigo 50 do Código Civil[1].
Entretanto, e conforme depreende-se da própria leitura do artigo acima citado, a desconsideração não ocorre em qualquer caso em que não haja liquidez da pessoa jurídica para saldar suas dívidas e obrigações, devendo ocorrer o abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.
Vale lembrar que a desconsideração da personalidade jurídica mereceu destaque também no Código de Ritos, que em seu artigo 133[2] e seguintes, determinou que o requerimento fosse formulado por meio de incidente processual, sendo cabível em todas as fases processuais[3].
Entretanto, há situações em que o sócio de determinada empresa, devedor de obrigações não saldadas, esvazia seu patrimônio em favor da pessoa jurídica no intuito de “blindá-lo”, tornando a pessoa física insolvente, ou ainda a sociedade empresária devedora não possui patrimônio para saldar suas obrigações, mas pertence à grupo econômico no qual uma controladora define suas atividades.
Nos casos acima, a Doutrina e a Jurisprudência admitem que a desconsideração da personalidade jurídica ocorra ao contrário do que preceitua o artigo 50 do Código Civil, isto é, seja atingida a pessoa jurídica do qual o devedor é sócio, ou mesmo outras empresas do mesmo grupo econômico da devedora. Este fenômeno jurídico nomeou-se desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Veja que o próprio artigo 133 do Código de Processo Civil já admite expressamente a existência do instituto, quando em seu § 2º determina a este a aplicação do capítulo da desconsideração da personalidade jurídica.
Como pode ser o incidente proposto a qualquer tempo, seus efeitos perduram até a extinção da execução, pois, do contrário, se colocaria em xeque até mesmo a utilidade da medida, uma vez que sua finalidade é a de garantir o cumprimento da obrigação.
O Superior Tribunal de Justiça, através do julgamento do Recurso Especial nº 1.733.403, entendeu que os efeitos da desconsideração inversa da personalidade jurídica devem perdurar até a extinção da execução.
A Relatora do referido Recurso Especial, Ministra Nancy Andrighi, ressaltou em seu voto que “Consubstanciada a unidade econômica entre a interessada e a recorrente, apta a incluir a segunda no polo passivo da execução movida contra a primeira, passam a ser ambas tratadas como uma só pessoa jurídica devedora, até a entrega ao credor da prestação consubstanciada no título executado”.
Mais adiante, aduziu a Ministra que “conquanto se trate de ações autônomas – a execução de título extrajudicial e os embargos à execução –, não são absolutamente independentes. Em verdade, as demandas se interpenetram, porque os embargos, apesar de assumirem a forma de ação de conhecimento, têm natureza de defesa do devedor-executado em face do credor-exequente. E, depois de julgados os embargos, a execução prossegue nos exatos limites do que neles foi decidido.”.
Por fim, concluiu a Ministra Nancy Andrighi que que o fato de uma das empresas coligadas não ter participado formalmente do processo de Embargos à Execução “não tem o condão de afastar sua responsabilidade patrimonial, enquanto integrante do mesmo grupo econômico.”.
Desta forma, mostra-se acertada a decisão acima comentada, uma vez que a própria essência do instituto é garantir o recebimento do crédito, sendo certo que as diferentes configurações societárias não podem servir de obstáculo à plena satisfação desses créditos.
[1] Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)
- 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
- 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
- 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
- 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
- 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)
[2]Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.
- 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.
- 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.
[3]Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.
Quinta Turma anula julgamento de apelação que não teve participação da defesa
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para anular o julgamento de uma apelação que ocorreu sem a participação da defesa depois de o advogado ter pedido adiamento em três oportunidades diferentes. Houve empate no julgamento da turma, resultado que favorece o paciente. O habeas corpus foi concedido ao fundamento de que a ausência do advogado configurou cerceamento da defesa.
Segundo o processo, o réu, acusado de infração à Lei de Licitações, foi absolvido em primeiro grau, mas condenado no julgamento da apelação pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3). A defesa opôs embargos de declaração, suscitando, entre outras questões, omissão acerca da informação sobre o falecimento do advogado do acusado, em data anterior ao julgamento da apelação – fato comprovado por certidão de óbito. Pediu, assim, a nulidade do acórdão condenatório.
Em maio último, o desembargador relator no TRF3 determinou a intimação do novo advogado para a sessão de julgamento dos embargos, oportunidade em que seria apreciada a questão de ordem com o pedido de anulação da condenação por falta de defesa. O advogado protocolou, em duas ocasiões, petições requerendo o adiamento do julgamento devido à impossibilidade de comparecer nas datas marcadas, pois já havia sido intimado anteriormente para outras audiências – o que foi acolhido pelo relator.
No entanto, o advogado, pela terceira vez, solicitou nova designação da sessão de julgamento, alegando que tinha de acompanhar audiência em outra comarca, o que inviabilizaria o seu comparecimento para fazer a sustentação oral no TRF3.
O pedido foi indeferido pelo relator, e o tribunal examinou a questão de ordem sem a presença do defensor. O colegiado anulou o julgamento da apelação e reapreciou o recurso do Ministério Público, dando-lhe provimento nos mesmos moldes do julgamento anulado.
Justo motivo
No STJ, o autor do voto vencedor, ministro Jorge Mussi, lembrou que, embora o tribunal entenda que a sustentação oral não é ato essencial à defesa e à apreciação da apelação criminal, a comprovação de causa que impeça o comparecimento do defensor impõe, excepcionalmente, o adiamento da sessão de julgamento. Ele mencionou precedente do Supremo Tribunal Federal nesse mesmo sentido.
Para o ministro, no caso, há peculiaridades que justificam a anulação do julgamento. “Além de o pleito de adiamento haver sido formulado com a devida antecedência – 14 dias antes da sessão –, o certo é que houve a efetiva demonstração da impossibilidade de comparecimento do advogado ao ato em razão de prévia designação de audiência em outro feito, em comarca diversa, que efetivamente se realizou”, disse.
Segundo Mussi, o defensor provou a existência de justo motivo para requerer o adiamento, em razão da sua impossibilidade de comparecer ao ato designado pelo TRF3, conforme prevê o artigo 265 do Código de Processo Penal. “Portanto, a realização do ato sem a presença do patrono do paciente, na hipótese, é apta a configurar cerceamento do direito de defesa, que enseja a sua nulidade”, afirmou.
Embora tenha havido três requerimentos de adiamento, segundo Mussi, “verifica-se que o paciente foi absolvido em primeira instância, sobrevindo a sua condenação no primeiro julgamento da apelação, o qual foi anulado justamente porque estava indefeso ante o falecimento de seu anterior patrono”.
Para o ministro, esse fato revela a importância da intervenção do advogado, seja para a realização de sustentação oral, seja para o esclarecimento de eventuais fatos surgidos no curso da sessão.
Intimação do terceiro garantidor é suficiente para validar penhora de imóvel hipotecado
Nas ações de execução com garantia hipotecária, a intimação dos terceiros garantidores é suficiente para validar a penhora sobre o bem, não havendo necessidade de que sejam citados para compor o polo passivo do processo.
Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que anulou a penhora de imóvel hipotecado sob o argumento de que os garantidores hipotecários deveriam integrar o polo passivo da demanda para que o bem pudesse ser submetido à constrição.
Na execução de título executivo extrajudicial, a empresa executada registrou a confissão em escritura pública, na qual foi oferecido em hipoteca imóvel de propriedade do sócio majoritário, que era casado em regime de comunhão universal de bens.
Em decisão interlocutória, o juiz considerou desnecessária a citação dos terceiros garantidores – o sócio e sua esposa – para integrar o polo passivo da execução, por entender que bastaria sua intimação quanto à penhora do imóvel dado em garantia.
A decisão foi reformada pelo TJSC, que entendeu ser imprescindível a citação porque não poderia ser admitido que a execução fosse dirigida a uma pessoa – o devedor principal – e a constrição judicial recaísse sobre bem de terceiro.
Citação dispensável
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, apontou que, para além dos sujeitos passivos da execução elencados no artigo 568 do Código de Processo Civil de 1973, admite-se uma legitimidade passiva extraordinária, que recai sobre aquele que, apesar de não ter contraído dívida, expõe o seu patrimônio à satisfação do crédito.
“É certo que, nessas hipóteses, sendo legitimado – extraordinariamente – para figurar no polo passivo da ação de execução, deve ser no bojo desta lide citado, na medida em que vivenciará o comprometimento de seu patrimônio para a satisfação do crédito objeto da ação executiva”, disse a relatora.
Entretanto, a ministra lembrou que, nos termos do artigo 655 do CPC/1973, nos casos de execução de crédito com garantia hipotecária, pignoratícia (quando o credor possui direito real de garantia exercitável sobre bem móvel) ou anticrética (quando há a transferência do bem ao credor, que dele pode retirar frutos para o pagamento da dívida), se a coisa dada em garantia pertencer a terceiro, este também será intimado da penhora.
Segundo a relatora, a intimação do terceiro garantidor acerca da penhora é necessária para lhe dar oportunidade de impugnação e oposição de embargos.
“E, com efeito, mostra-se dispensável que o terceiro garantidor – proprietário do bem hipotecado – integre a lide executiva, sendo suficiente a sua intimação em relação ao ato constritivo”, concluiu a ministra.
Leia o acórdão.
Créditos apurados no programa Reintegra não fazem parte da base de cálculo do IRPJ e da CSLL
A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os créditos apurados no âmbito do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para Empresas Exportadoras (programa Reintegra) não compõem a base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) mesmo antes da Medida Provisória 651/2014, que afastou do cômputo dos tributos os valores obtidos por meio do programa.
Por maioria de votos, o colegiado considerou – de forma semelhante ao entendimento adotado no caso dos créditos presumidos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) – que a finalidade do benefício do Reintegra (incentivo fiscal na forma de recuperação dos custos tributários incidentes na exportação de produtos) inviabiliza a inclusão dos créditos no cálculo de IRPJ e CSLL.
Na ação que originou o recurso especial, uma empresa exportadora de produtos alimentícios alegou que os valores recebidos por meio do Reintegra compuseram indevidamente, nos anos de 2012 e 2013, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, aumentando o valor recolhido a título desses tributos.
O pedido para que os créditos do programa fossem excluídos da base de cálculo tributária foi julgado improcedente em primeiro grau, em sentença mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Segundo o tribunal, somente com o advento da Medida Provisória 651/2014, que reinstituiu o benefício do Reintegra – MP convertida na Lei 13.043/2014 –, é que o valor do crédito apurado, por expressa previsão legal, deixou de compor a base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
No recurso especial, a empresa de alimentos alegou que não há lucro com o incentivo recebido por meio do Reintegra, pois o crédito é apenas devolvido como compensação por um resíduo tributário que o próprio governo sabe ser indevido. Seria, para a empresa, uma espécie de desoneração tributária, que não representaria fato gerador de tributos.
Interesse preponderante
No voto acompanhado pela maioria do colegiado, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho afirmou que, no sistema de incentivo aos exportadores, o fisco e o contribuinte possuem interesses específicos: enquanto o fisco busca dinamizar as exportações, os exportadores objetivam auferir maiores lucros em sua atividade.
De acordo com o ministro, no propósito de menor tributação, o legislador entendeu que a satisfação do interesse público primário – representado por desenvolvimento econômico, geração de emprego e de renda, além do aumento da capacidade produtiva – seria preponderante sobre a pretensão fiscal irrestrita.
Nesse sentido, Napoleão Nunes Maia Filho destacou que a Primeira Turma firmou, no julgamento do REsp 1.210.941, o entendimento de que a inclusão de valores relativos a créditos presumidos de IPI na base de cálculo do IRPJ e da CSLL teria como resultado o esvaziamento da política fiscal de desoneração, cujo objetivo é aliviar a carga tributária.
Naquela decisão, o colegiado concluiu que o crédito ficto de IPI é destinado a ressarcir custos suportados indiretamente pela empresa exportadora na compra de matérias-primas e insumos no mercado interno e que foram submetidos a tributação que não incide no caso de vendas destinadas ao exterior, inviabilizando o procedimento compensatório.
“Os fundamentos adotados para afastar a incidência do IRPJ e da CSLL sobre o crédito presumido de IPI têm aplicação ao caso dos autos, haja vista a identidade da natureza e finalidade do benefício fiscal do Reintegra, qual seja, incentivo estatal na forma de recuperação dos custos tributários incidentes na exportação de produtos” – concluiu o ministro ao afastar da base de cálculo dos tributos os créditos apurados no Reintegra.
Previsão legal
Ao acompanhar o voto do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a ministra Regina Helena Costa assinalou que a Segunda Turma firmou entendimento segundo o qual é legal a incidência de IRPJ e da CSLL sobre os créditos apurados no Reintegra, uma vez que provocariam redução de custos, com consequente elevação do lucro da pessoa jurídica.
Entretanto, de acordo com a ministra, a exclusão dos créditos do Reintegra das bases de cálculo dos tributos, promovida em 2014, constituiu autêntico reconhecimento legislativo do indevido alargamento da base de cálculo do IRPJ e da CSLL antes da vigência da MP 651.
“Por outro lado, impende ponderar que, ainda que assim não se entenda, a inclusão de tais valores em período anterior à vigência da aludida medida provisória é que, a rigor, demandaria previsão legal específica para ser legitimada, conforme determinam os artigos 150, I, da Constituição da República, e 97, IV e parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional, porquanto traduz aumento indireto de tributação, agravado, ainda, pela tônica notoriamente desoneradora do regime”, apontou a ministra.
Leia o acórdão.
Fonte: STJ
Aluguéis vencidos podem ser incluídos em execução de atrasados, mesmo quando valor é provisório
No curso de uma execução de aluguéis atrasados, mesmo na hipótese de interposição de embargos do devedor, é possível a inclusão dos aluguéis vencidos durante o processo, com base no valor da locação fixado em ação revisional.
Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou o recurso de um devedor de aluguéis. Para o colegiado, não prospera a tese de que a cobrança de eventuais diferenças somente poderia ser feita na ação revisional e depois do trânsito em julgado da decisão de mérito nesta ação.
Segundo a relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, a interpretação dada ao artigo 69 da Lei 8.245/1991 não pode ser tal que prejudique o direito do locador de receber, desde logo, os aluguéis que lhe são devidos, condicionando o seu exercício ao trânsito em julgado da ação revisional.
O locatário opôs embargos do devedor alegando nulidade no processo de execução dos aluguéis, falta do título executivo, iliquidez, incerteza e inexigibilidade do crédito, e ausência de trânsito em julgado da decisão que deu origem ao suposto crédito.
Após sentença parcialmente favorável ao locatário, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu razão ao locador, sob o argumento de que há muito a jurisprudência vem interpretando extensivamente o texto legal a fim de permitir a inclusão das prestações periódicas vencidas no curso da execução de título extrajudicial, desde que fundadas em obrigação líquida e certa – como no caso analisado, em que se executam aluguéis e demais encargos da locação.
No recurso especial, o devedor afirmou que o locador moveu a execução com base em aluguel provisório fixado em ação revisional, o qual foi alterado na decisão final de mérito. Por isso, as quantias cobradas não seriam líquidas e certas, “e muito menos exigíveis”.
Crédito exigível
Nancy Andrighi destacou que, uma vez arbitrado o valor do aluguel – seja o provisório e/ou o definitivo –, revela-se o crédito do locador certo quanto à sua existência, líquido quanto ao seu valor, bem como exigível, desde a citação na ação revisional.
“O arbitramento do aluguel provisório faz nascer, num primeiro momento, a obrigação do locatário de pagá-lo no vencimento, a partir da citação, e, por conseguinte, o direito do locador de exigi-lo, tão logo constatada eventual mora”, explicou a relatora.
Ela frisou que “a fixação do aluguel definitivo em quantia inferior à do aluguel provisório, num segundo momento, faz surgir para o locatário o direito à repetição do indébito, relativamente às parcelas pagas depois da citação, ou à compensação da diferença com os aluguéis vincendos”.
A ministra lembrou que as diferenças às quais se refere o artigo 69 da Lei 8.245/1991 dizem respeito a quanto o valor do aluguel provisório, cobrado antecipadamente, é maior ou menor que o valor do aluguel arbitrado definitivamente, resultando em um crédito para o locador ou para o locatário.
Nancy Andrighi afirmou ainda que a eventual existência desse crédito, no entanto, não impede o locador de executar os aluguéis devidos pelo locatário desde a citação na ação revisional, tal como decidiu o tribunal de origem.
Leia o acórdão.