Como sabemos, a Lei Processual Civil traz instrumentos para que se dê efetividade às decisões judicial, em especial aquelas que imputam a uma das partes uma obrigação de fazer ou não fazer. E o fazem através da possibilidade de o magistrado, na própria decisão que determina o cumprimento de determinada obrigação, arbitrar uma multa para incidir em certa periodicidade ou mesmo por evento que contrarie a decisão judicial.
Até mesmo nas obrigações de pagar quantia certa, a Lei Processual encontrou na multa o elemento coercitivo para dar efetividade e celeridade ao cumprimento dos julgados.
Entretanto, em algumas situações nem mesmo este elemento é suficiente para compelir o devedor a cumprir certa decisão judicial. Há casos em que a multa é arbitrada com um teto máximo para sua incidência, tendo em vista que, uma vez que a multa é devida ao Exequente, não poderia ela configurar um ganho desarrazoado à parte. o artigo 537, §1º, I, expressamente prevê que o magistrado pode modificar ou mesmo excluí-la caso se torne excessiva.
Devemos lembrar que o objetivo da Lei é, por certo, o cumprimento das decisões judiciais e as obrigações nela existentes, e não o pagamento de vultosas quantias decorrentes de multas.
Mas, e quando a impontualidade do devedor de uma obrigação de fazer, ao não cumpri-la no prazo estipulado, acaba por gerar dano a outrem? Seria possível, em outro processo, uma vez que a lide da qual surgiu a obrigação já está delineada, requerer a condenação do devedor em perdas e danos, estes eminentemente morais ou extrapatrimoniais? A resposta, segundo o entendimento manifestado pela E. Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, é positiva.
Através do julgamento do REsp 1.689.074, o Ministro Moura Ribeiro, relator do recurso, entendeu ser possível a cumulação da multa cominatória anteriormente arbitrada em obrigação de fazer e a cobrança, em ação autônoma, de indenização por danos morais, pelo descumprimento da referida obrigação.
Nas palavras do Ministro Moura Ribeiro, “os institutos têm natureza jurídica diversa. A multa tem finalidade exclusivamente coercitiva, e a indenização por danos morais tem caráter reparatório, de cunho eminentemente compensatório – portanto, perfeitamente cumuláveis”.
A hipótese analisada versava sobre uma sentença de procedência proferida em ação judicial ajuizada por um consumidor que concedia a ele uma indenização por danos morais pela ausência de cumprimento de obrigação de fazer com multa cominatória arbitrada em outra decisão.
Na hipótese dos autos, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao julgar recurso da instituição bancária, entendeu que o consumidor deveria requer a execução e o levantamento da multa cominatória arbitrada na decisão que determinou o seu comprimento. Para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, seria impossível arbitrar indenização por um fato em que já há multa cominatória arbitrada.
A Terceira Turma, através de acórdão publicado em 18 de Outubro, entendeu que a natureza dos dois institutos são diferentes e, por tal motivo, poderiam ser cobradas de maneira independente. Para o Ministro, a indenização visa reparar um dano causado por um ato ilícito, sofrido por alguma agressão ou atentado contra a dignidade, ao passo que a multa cominatória teria cabimento pelo descumprimento de ordens judiciais. O Ministro Relator foi acompanhado pelos Ministros Nancy Andrigui, Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Boas Cueva e Marco Aurélio Belizze.
Devemos alertar que, em que pese o entendimento exposto no julgado em referência, tanto a multa cominatória quanto eventual condenação em danos morais possuem um elemento em comum: o caráter pedagógico-punitivo. Resta claro que a multa visa coibir o descumprimento de decisão judicial, ao passo que a indenização por danos morais, ainda que não exclusivamente, visa fazer com que o causador do dano cesse a prática de algum ato ilícito, assemelhando e equiparando, embora tenham naturezas distintas, os dois institutos analisados.
Olhando com a devida cautela para a decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, temos a certeza que, independentemente de sua correção, as quantias não podem configurar no enriquecimento sem causa da parte, e devem se pautar no Princípio da Razoabilidade, sob pena de desvirtuarem o seu principal objetivo.