Honorários arbitrados em ação de cobrança de cotas condominiais contra antigo proprietário não podem ser cobrados de novo comprador


A questão proposta neste artigo traz ao debate dois institutos que com absoluta frequência aparecem diante do advogado que atua na esfera cível: as obrigações propter rem e os honorários advocatícios.

Antes de adentrar propriamente no evento que inspirou o presente estudo, que por certo trata simultaneamente dos dois institutos, é necessário que se pontue a natureza jurídica das obrigações propter rem ou ambulatórias, com a finalidade do completo e correto entendimento.

Diz-se das obrigações propter rem aquelas que aderem à coisa a qual estão vinculadas. Pouco importa quem seja seu proprietário ou quem a contraiu; as obrigações decorrem do próprio bem. Temos como exemplos as obrigações referentes ao pagamento do rateio das despesas condominiais, a obrigação do pagamento do IPTU, entre outras menos conhecidas.

Quanto aos honorários advocatícios sucumbenciais, estes por certo pertencem ao advogado por força do disposto no artigo 23 da Lei Federal 8.906/94[1], e são decorrentes da derrota de determinado litigante em juízo.

Desta forma, por certo que uma ação de cobrança ou execução de cotas condominiais, decorrentes da mora do proprietário do imóvel situado no condomínio autor, uma vez julgados procedentes os pedidos condenatórios, condenará o vencido, além do pagamento do débito condominial, ao pagamento de honorários de sucumbência que serão arbitrados na forma do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil[2].

Em um primeiro momento, poder-se-ia pensar que, uma vez que os honorários de sucumbência decorrem do acolhimento do pedido principal e que, por este motivo, teria mesma natureza jurídica deste, sendo, portanto, no caso sub exame, também de natureza propter rem, podendo ser exigidos de quem formalmente se apresentar como dono da coisa, tal como a obrigação condominial.

Assim, mesmo que o imóvel fosse alienado, a obrigação ao pagamento de honorários de advogado, assim como a cobrança da própria obrigação propter rem, poderia ser redirecionada ao novo proprietário.

Entretanto, não foi neste sentido que entendeu o Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Através do julgamento do Recurso especial nº 1.730.651, a Terceira Turma do STJ entendeu que a obrigação de pagar honorários advocatícios oriundos de obrigação propter rem não tem essa mesma natureza, não podendo ser, portanto, cobrados do novo proprietário.

A relatora, Ministra Nancy Andrighi, ressaltou em seu voto justamente o caráter autônomo da verba honorária, como destacamos acima e que encontra-se expressa no artigo 23 da Lei Federal 8.906/94. Vejamos:

“Trata-se, portanto, de dívida da parte vencida frente ao advogado da parte vencedora, totalmente desvinculada da relação jurídica estabelecida entre as partes da demanda”.

Em seu voto, a Ministra ainda ressaltou que a obrigação propter rem, mais especificamente aquela oriunda do pagamento do rateio das despesas condominiais, protege o interesse da coletividade comunheira, permitindo que o condomínio possa honrar seus compromissos e receba, independentemente de quem seja o dono da unidade, a verba devida.

O mesmo não ocorre com os honorários de sucumbência, que interessam ao advogado e decorrem da mora de determinado devedor, contra o qual foi necessário o ajuizamento da ação judicial.

Neste sentido andou o voto da Ministra Relatora:

“Daí se conclui que a obrigação de pagar as verbas de sucumbência, ainda que sejam elas decorrentes de sentença proferida em ação de cobrança de cotas condominiais, não pode ser qualificada como ambulatória (propter rem) e, portanto, não pode ser exigida do novo proprietário do imóvel sobre o qual recai o débito condominial”

A Ministra ainda explicou que as obrigações propter rem podem ser traduzidas naquelas que “se vinculam à titularidade de um direito real, independentemente da manifestação de vontade do titular, e, por isso, são transmitidas a todos os que lhe sucedem em sua posição; são, pois, assumidas por causa da coisa’”.

A decisão do Superior Tribunal de Justiça pode trazer determinados questionamentos, mormente porque poderia criar situação em que o condomínio veja seu crédito satisfeito diante da possibilidade de um novo adquirente possuir capacidade de pagamento da obrigação, ao passo que o advogado continuaria a perseguir seu crédito de um devedor que pode inclusive ter alienado o imóvel por falta de condições de honrar seus compromissos.

Desta forma, não se pode descartar que a causalidade da verba de sucumbência decorre da mora condominial e que dela é decorrente, ainda que possa ser cobrada de maneira autônoma pelo advogado.


[1] Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.

[2] Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

  • 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I – o grau de zelo do profissional;

II – o lugar de prestação do serviço;

III – a natureza e a importância da causa;