No dia 21.05.2018, foi deflagrada paralisação nacional dos caminhoneiros. Dentre as reivindicações do setor, destacam-se a revisão da política de variação de preço, em especial do óleo diesel, realizada pela Petrobras; o fim da cobrança de pedágio pelo chamado “eixo suspenso”; e a redução da carga tributária sobre os combustíveis.
As negociações, centradas no Governo Federal, tiveram impacto direto tão somente nas condições que cabem a tal ente público interferir. Foram editadas, então, três medidas provisórias, publicadas no Diário Oficial da União do dia 30.05.2018, para garantir o acordo com os caminhoneiros e reduzir em aproximadamente R$ 0,46 o preço do litro do diesel.
O Presidente Michel Temer editou, ainda, decreto que reduziu a CIDE sobre o diesel.
Embora no curto prazo as medidas resultem em diminuição do preço do combustível, há que se observar a figura completa: redução nominal e apressada de tributos gera renúncia de receita, que precisa ser compensada com aumento de arrecadação em outros setores. Tanto é assim que, no mesmo dia 30, o Presidente da República sancionou a Lei da “reoneração” da folha de pagamentos e já anunciou que reduzirá os benefícios concedidos aos exportadores como meios de compensar o crédito suplementar de 9,58 bilhões de reais aberto para garantir as medidas.
Não se duvida que parte significativa da redução de preços realmente deve partir da revisão da carga tributária. A gasolina, por exemplo, tem o preço formado por média de 29% de tributos estaduais, como o ICMS, e 16% de tributos federais, como a CIDE, o PIS e a COFINS. A discussão, contudo, precisa ser mais profunda e não pautada apenas em métodos paliativos.
Em 11.04.2018, diante de autoridades da área econômica e da Casa Civil, o IPEA lançou o projeto Desafios da Nação[1], que reúne diagnósticos e propostas para viabilizar o crescimento sustentado do país, tendo como foco principal a elevação da produtividade.
No documento, chama a atenção o Capítulo 5, intitulado Reforma Tributária – Racionalizar o sistema tributário, especialmente o enfoque dado aos tributos indiretos. É possível perceber que o próprio Governo Federal reconhece o sistema tributário brasileiro como uma “estrutura desconexa e caótica”, repercutindo negativamente em aspectos como o crescimento econômico, a competitividade nacional e a distribuição de renda.
Interessante, ainda, é a comparação gráfica entre países com sistema de governo semelhante ao brasileiro, cuja reprodução é indispensável para compreensão do tema:
Basta um olhar superficial para visualizar um dos principais problemas do sistema tributário nacional: a intensa representatividade dos ali chamados “impostos sobre bens e serviços”, também conhecidos como tributos indiretos, uma vez que, embora sejam recolhidos e pagos pelos produtores, prestadores de serviço e pelos comerciantes, acabam atingindo indiretamente os consumidores finais, por conta da inclusão dos tributos nos preços das mercadorias e dos serviços, tal como ocorre tanto com a gasolina quanto com o óleo diesel.
A prevalência de tributos indiretos conduz o sistema à injustiça, já que a regressividade da tributação sobre o consumo acaba por onerar mais gravemente os mais pobres. Além disso, referidos tributos indiretos são desarmônicos entre si e fortemente cumulativos, na medida em que compõe um a base de cálculo do outro e, em alguns casos, até a própria base de cálculo, no chamado “cálculo por dentro”.
Para além da carga tributária nominal, há a complexidade do sistema, cujos vícios são substancialmente aprofundados pela diversidade de competências tributárias (em especial Estaduais e Municipais), que propiciam assustadora diferença entre legislações sobre os mesmos impostos e uma impressionante diversidade de alíquotas, provocando cumulação de créditos estruturais e perda da neutralidade do tributo, tudo agravado em razão do crescente número de isenções e benefícios fiscais.
Passo importante na evolução do modelo tributário foi dado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706, em que se firmou a tese de que o ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. Os reflexos da decisão já vêm sendo observados também em outros tributos, de modo que estão sendo proferidas decisões, por exemplo, também pela exclusão do ISS e da CPRB da base de cálculo do PIS e da COFINS.
Estas decisões, todavia, somente se aplicam aos contribuintes que ingressarem em juízo deduzindo tais pretensões, de modo que a necessidade de uma solução efetiva para o problema se mantém e passa, invariavelmente, por uma reforma estrutural. Em atenção a isso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pretende dar andamento à proposta de reforma tributária relatada pelo deputado Luiz Carlos Hauly.
Da medida, o que mais se destaca é a proposta de instituição do internacionalmente utilizado imposto único sobre o consumo, que por aqui chamar-se-á Imposto Sobre Operações de Bens e Serviços (IBS). Se aprovado como apresentado, o IBS substituiria ICMS, IPI, PIS, COFINS, CIDE, Pasep, IOF e Salário-educação, com repasse automático aos governos com a respectiva proporção destinada a municípios, estados e União.
Inciativas da espécie tendem a tornar a tributação mais simples, clara, justa e previsível, reduzindo os custos do setor produtivo. É indispensável, porém, que sejam aliadas à redução de gastos e aumento da eficiência do setor público.
[1] http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/180327_desafios_da_nacao.pdf