Constrição de bens de terceiro não constante do polo passivo de execução fiscal é possível em caso de fraude


Como sabemos, o procedimento da execução fiscal, previsto na Lei Federal 6.830/80, dá à Fazenda Pública, entre outros aspectos, uma série de proteções e prerrogativas aos entes federativos titulares dos créditos tributários em juízo.

Tais proteções e prerrogativas são compreensíveis ante o manifesto interesse público na recuperação desses créditos tributários, necessários a custear os deveres do estado quanto às suas obrigações legais.

Como exemplo, em artigo anterior, tivemos a oportunidade de abordar a desnecessidade de incidente de desconsideração para redirecionamento da execução fiscal contra pessoa jurídica, em que o Superior Tribunal de Justiça (STJ), através do julgamento do Recurso Especial nº 1.783.311, entendeu pela desnecessidade de observância do incidente previsto no artigo 133 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC) quando se está diante do procedimento executivo fiscal, regido pela Lei Federal 6.830/80.

Entre os procedimentos atinentes ao recebimento dos créditos fiscais por parte da Fazenda Pública, a Lei instituiu a Medida Cautelar Fiscal (Lei Federal 8.397/92 – Institui medida cautelar fiscal e dá outras providências), podendo esta ser requerida nos casos constantes do seu artigo 2º[1], como, exemplificativamente, quando o devedor aliena ou tenta alienar bens, podendo se tornar insolvente.

A pergunta, frente ao que consta acima, é: poderia a Medida Cautelar efetuar a constrição de bens de terceiro que não seja parte no executivo fiscal do qual a Cautelar é incidente?

A questão chegou ao STJ após o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ter limitado a medida de indisponibilidade de bens ao processo executivo fiscal e aos Executados ali indicados, não admitindo que a medida alcançasse pessoas que não integravam o polo passivo do executivo fiscal.

Coube ao Ministro Gurgel de Faria a relatoria do Recurso Especial nº 1.656.172.

Em seu voto, o Ministro Relator destacou que não há entrave jurídico na decretação da indisponibilidade de bens de terceiros não integrantes do executivo fiscal quando se trata de atos fraudulentos por eles praticados, podendo a Medida Cautelar Fiscal ser direcionada a estes terceiros.

Destacou o Ministro que “havendo prova da ocorrência de fraude por grupo de pessoas físicas e/ou jurídicas, como a criação de pessoas jurídicas fictícias para oportunizar a sonegação fiscal ou o esvaziamento patrimonial dos reais devedores, o juízo da execução pode redirecionar a execução fiscal às pessoas envolvidas”.

Concluiu o Ministro que “assim como acontece com as pessoas físicas, ocorrendo qualquer das hipóteses previstas no Código Tributário Nacional para responsabilização pessoal de terceiros (por exemplo, artigos 124134 e 135), a execução fiscal pode ser redirecionada ao responsável, ficando este, portanto, passível de alcance das medidas constritivas do processo executivo”.

Desta forma, a decisão proferida pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região foi parcialmente anulada pelo Superior Tribunal de Justiça, que determinou ao Tribunal Regional que analise novamente o pedido de indisponibilidade de bens quanto às demais pessoas indicadas na cautelar fiscal.

Entendemos correto o posicionamento adotado pelo STJ, ao passo que é preciso dar efetividade ao executivo fiscal no que tange à recuperação dos créditos tributários.

Entretanto, devemos ressaltar que a medida, tal como analisada acima, só é justificável em casos em que houver fraude e atos contrários à Lei, no intuito de esvaziamento patrimonial dos devedores, devidamente comprovados, e conferindo a todos a ampla defesa e o contraditório no devido processo legal.


[1]Art. 2º A medida cautelar fiscal poderá ser requerida contra o sujeito passivo de crédito tributário ou não tributário, quando o devedor:                   (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

I – sem domicílio certo, intenta ausentar-se ou alienar bens que possui ou deixa de pagar a obrigação no prazo fixado;

II – tendo domicílio certo, ausenta-se ou tenta se ausentar, visando a elidir o adimplemento da obrigação;

III – caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta pôr seus bens em nome de terceiros ou comete qualquer outro ato tendente a frustrar a execução judicial da Dívida Ativa;

III – caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar bens;              (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

        IV – notificado pela Fazenda Pública para que proceda ao recolhimento do crédito fiscal vencido, deixa de pagá-lo no prazo legal, salvo se garantida a instância em processo administrativo ou judicial;

IV – contrai ou tenta contrair dívidas que comprometam a liquidez do seu patrimônio;                (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

        V – possuindo bens de raiz, intenta aliená-los, hipotecá-los ou dá-los em anticrese, sem ficar com algum ou alguns, livres e desembaraçados, de valor igual ou superior à pretensão da Fazenda Pública.

V – notificado pela Fazenda Pública para que proceda ao recolhimento do crédito fiscal:                  (Redação dada pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

  1. a) deixa de pagá-lo no prazo legal, salvo se suspensa sua exigibilidade;                       (Incluída pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)
  2. b) põe ou tenta por seus bens em nome de terceiros;                    (Incluída pela Lei nº 9.532, de 1997)(Produção de efeito)

VI – possui débitos, inscritos ou não em Dívida Ativa, que somados ultrapassem trinta por cento do seu patrimônio conhecido;                      (Incluído pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

VII – aliena bens ou direitos sem proceder à devida comunicação ao órgão da Fazenda Pública competente, quando exigível em virtude de lei;                     (Incluído pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

VIII – tem sua inscrição no cadastro de contribuintes declarada inapta, pelo órgão fazendário;                     (Incluído pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)

IX – pratica outros atos que dificultem ou impeçam a satisfação do crédito.                      (Incluído pela Lei nº 9.532, de 1997)    (Produção de efeito)