Ampliação do colegiado é aplicável em Agravo que reforma decisão em crédito em recuperação judicial


O Julgamento dos recursos pelas turmas e câmaras dos Tribunais sempre foi matéria de absoluta relevância dentro do processo civil.

Igualmente, a forma de se julgar os recursos pelos colegiados, e sempre pautados em princípios como o da Celeridade, Imparcialidade e Ampla Defesa, também mereceu atenção e ajustes ao longo do tempo.

Exemplificativamente, vê-se a evolução dos julgamentos não unânimes pelos colegiados das Câmaras e Turmas, que já mereceram inclusive recurso próprio – Embargos Infringentes. Estes, inclusive, sofreram ao longo do tempo alteração em seu cabimento, inicialmente cabível de qualquer dissidência em julgamento de apelação e, após, apenas da decisão não unânime que reformasse a sentença de mérito [1].

Mas o fato é que a divergência que ensejaria este novo recurso se dava apenas em sede de Recurso de Apelação, tendo em vista ser o recurso cabível em face da sentença de mérito.

Dentre várias mudanças trazidas na legislação processual, através da entrada em vigor do Novo Código Civil [2] foi a técnica de julgamento inserida no seu artigo 942, que assim dispõe:

Art. 942. Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

  • 1º Sendo possível, o prosseguimento do julgamento dar-se-á na mesma sessão, colhendo-se os votos de outros julgadores que porventura componham o órgão colegiado.
  • 2º Os julgadores que já tiverem votado poderão rever seus votos por ocasião do prosseguimento do julgamento.
  • 3º A técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em:

I – ação rescisória, quando o resultado for a rescisão da sentença, devendo, nesse caso, seu prosseguimento ocorrer em órgão de maior composição previsto no regimento interno;

II – agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito.

  • 4º Não se aplica o disposto neste artigo ao julgamento:

I – do incidente de assunção de competência e ao de resolução de demandas repetitivas;

II – da remessa necessária;

III – não unânime proferido, nos tribunais, pelo plenário ou pela corte especial.

Dissecando o artigo acima transcrito, vê-se que, por regra, a técnica de julgamento ou ampliação do colegiado do órgão julgador aplica-se naqueles casos em que se julgar de maneira não unânime o recurso de apelação, o que guarda semelhança com a antiga sistemática no que tange aos Embargos Infringentes.

Entretanto, o Código de Processo Civil trouxe também como novidade a possibilidade de se resolver parcialmente o mérito através da prolação de decisão interlocutória pelo juiz de primeira instância, desafiando esta decisão, neste caso, não o recurso de apelação, mas sim o recurso de Agravo de Instrumento.

Inclusive, e de forma correta, o legislador processual inseriu expressamente no rol das hipóteses de cabimento do Agravo de Instrumento a decisão interlocutória que verse sobre o mérito do processo [3].

Voltando ao artigo 942 do Código de Processo Civil, descrito acima, e tendo em vista a possibilidade de uma decisão interlocutória decidir quanto ao mérito do processo, sendo atacada por Agravo de Instrumento em via recursal, coube ao legislador a preocupação de garantir, através da ampliação do colegiado, ainda que o recurso não fosse o de apelação, a técnica de julgamento para estes casos.

E é exatamente essa a hipótese do § 3º, II, do artigo 942 do CPC:

  • 3º A técnica de julgamento prevista neste artigo aplica-se, igualmente, ao julgamento não unânime proferido em:

II – agravo de instrumento, quando houver reforma da decisão que julgar parcialmente o mérito.

E o tema analisado neste artigo versará exatamente sobre esta situação, em um caso concreto consubstanciado na ampliação do colegiado no julgamento de Agravo de Instrumento que reforma decisão sobre crédito em recuperação.

A hipótese é a de julgamento de Agravo de Instrumento por Câmara do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, ao analisar as razões recursais, entendeu por reformar decisão de primeiro grau relativa à impugnação de créditos em recuperação, mas não ampliou o colegiado para possibilitar, em tese, a reversão do entendimento emanado no julgamento.

A parte vencida interpôs então Recurso Especial, sendo o referido recurso autuado sob o nº 1.797.866, cuja relatoria coube ao Ministro Villas Bôas Cueva, da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça.

Em seu voto, o relator entendeu pela necessidade de ampliação do colegiado, e consequente aplicação do artigo 942 do Código de Processo Civil para o caso concreto. Justificou o Ministro relator que “a decisão que põe fim ao incidente de impugnação de crédito, pronunciando-se quanto à validade do título (crédito), seu valor e a sua classificação, é inegavelmente uma decisão de mérito”

Desta forma, e tendo em vista que a própria natureza da decisão impugnada é de sentença, por certo trataria de mérito, o que levaria à aplicação da regra do artigo 942 do Código de Processo Civil.

Por fim, concluiu o Ministro que “houve, portanto, pronunciamento quanto à validade do crédito e sua classificação, mérito da ação declaratória, e não sobre questão de índole processual”, anulando o acórdão e determinando que seja realizada nova sessão de julgamento, nos moldes previstos no artigo acima citado.

A decisão afigura-se inteiramente correta, pois é inegável que a decisão de existência ou não de crédito em recuperação fulmina eventual direito do credor e, também, do devedor quanto ao tema, sendo inegavelmente de mérito, podendo, assim, em caso de decisão não unânime, ser apreciada pelo colegiado estendido.


[1] Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência.       (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

[2] Lei Federal n.º 13.105/2015

[3] Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

II – mérito do processo;