A impossibilidade de responsabilização da instituição bancária por emissão de cheques sem fundo de seu correntista


O banco possui com seu correntista um contrato de prestação de serviços e de depósito, onde se obriga a prestar os serviços previamente contratados e, igualmente, a manter sob sua custódia o dinheiro entregue pelo contratante. Um destes serviços é a disponibilização de cheques para ordens de pagamento à vista em nome do correntista.

O cheque é uma das modalidades mais antigas de ordem de pagamento à vista em que o correntista determina ao banco o pagamento a um terceiro de valores depositados em sua conta junto à instituição financeira.

Excetuados os casos em que o correntista conta com uma linha de crédito junto à instituição financeira para cobertura de despesas além de seu saldo bancário, o conhecido “cheque especial”, a instituição bancária não está obrigada a garantir o pagamento da ordem de pagamento à vista do correntista que não possui fundos em sua conta bancária.

Igualmente, apenas o banco e seu correntista, em regra, são conhecedores dos recursos disponíveis na conta junto à instituição financeira.

Em épocas de crise econômica como a que assola o país nos últimos anos, o número de pessoas inadimplentes e a consequente emissão de cheques “sem fundos” cresce exponencialmente.

A questão então posta para análise versa sobre a possibilidade ou não da instituição financeira ser responsabilizada pela emissão de um cheque com insuficiência de fundos por parte de seu correntista. Mais ainda: se seria possível equiparar o terceiro tomador do cheque, sem vínculo com a instituição financeira, a consumidor.

Recentemente, a questão foi posta em análise por parte do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.

Através do Recurso Especial nº 1.508.977 a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, reformou decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, que entendia que o terceiro tomador do cheque equiparava-se ao consumidor, uma vez que se utilizava do serviço bancário como destinatário final.

O Ministro Villas Boas Cueva, relator do Recurso especial em referência, e cujo voto foi seguido pela maioria da Terceira turma, considerou não haver defeito na prestação dos serviços bancários na hipótese em comento. Asseverou o Ministro que, justamente por esse motivo, “afasta a possibilidade de emprestar a terceiros – estranhos à relação de consumo havida entre o banco e seus correntistas – o tratamento de consumidores por equiparação”.

O Ministro ainda ressaltou que “verificando o sacado que o valor do título se revela superior ao saldo ou ao eventual limite de crédito rotativo de seu correntista, deve o banco devolver o cheque por falta de fundos”.

Vale ressaltar ainda que a única hipótese capaz de, em tese, gerar uma responsabilização da instituição bancária seria o defeito na prestação dos serviços, o que ocorreria, por exemplo, pela devolução de cheque por suposta insuficiência de fundos quando estes estejam presentes.

Vale destacar ainda trecho do julgado acima citado, em que o Relator conclui que “inexistindo equívoco na realização de tal procedimento, não há que falar em defeito na prestação do serviço e, consequentemente, não se revela plausível imputar ao banco prática de conduta ilícita ou a criação de risco social inerente à atividade econômica por ele desenvolvida capaz de justificar sua responsabilização pelos prejuízos materiais suportados por beneficiários dos cheques resultantes única e exclusivamente da ausência de saldo em conta dos emitentes suficiente para sua compensação.

Entendemos acertada a posição manifestada pelo Superior Tribunal de Justiça, uma vez que não cabe ao banco garantir o pagamento do cheque emitido contra ele ou mesmo existência de fundos nas contas sob sua responsabilidade.

Ao banco cabe apenas a conferência da existência de fundos ou outros aspectos necessários à segurança e efetivação do pagamento da ordem recebida, e posterior comunicação dos motivos do não pagamento.

Ressalte-se ainda o entendimento manifestado na decisão quanto à ausência de nexo de causalidade, o que seria requisito essencial para a existência de eventual responsabilidade civil.