Enquanto assistimos o mundo, principalmente os países europeus, avançarem com projetos cada vez mais voltados à equidade de gênero, estimulando a contratação de mulheres, ajustando a discrepância de salários, a posição em cargos de liderança, bem como concedendo às trabalhadoras os benefícios adequados durante o período de licença maternidade, para que não sofram impactos financeiros, eis que nos deparamos aqui no Brasil com recente posicionamento da Receita Federal do Brasil (RFB), exarado por meio da Solução de Consulta COSIT nº 27/2023, que afirma que a contribuição previdenciária deve incidir sobre a parcela de remuneração paga à trabalhadora durante a prorrogação da licença maternidade por mais 60 (sessenta) dias, prevista na Lei nº 11.770/2008.
A referida Lei criou o Programa Empresa Cidadã, que instituiu a prorrogação por mais 60 (sessenta) da licença-maternidade que já possui prazo regular de 120 (cento e vinte) dias. A prorrogação do período de licença-maternidade disponibiliza, para as empresas participantes do Programa, um incentivo fiscal atrelado à dedução do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
O alargamento do período de licença maternidade não passou em branco aos questionamentos das empresas quando se fala da incidência da contribuição previdenciária. E nesse ponto, quando instados a se manifestarem, os Tribunais estabeleceram entendimento idêntico ao consolidado pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário 576.967/PR, com repercussão geral reconhecida (Tema nº 72), ou seja, por se estar diante de situação idêntica em que a trabalhadora segurada recebe remuneração ao longo do seu período de afastamento em razão da licença maternidade, sem que haja qualquer prestação de serviço, não há que se falar em remuneração com natureza salarial, devendo, portanto, ficar afastada a incidência da contribuição previdenciária também sobre essa parcela paga no período de prorrogação.
Entretanto, não obstante o posicionamento dos Tribunais pela não tributação da licença-maternidade estendida, a RFB emitiu posicionamento vinculante diverso, afirmando que a declaração de inconstitucionalidade proferida pelo STF “não abrange a remuneração paga durante a prorrogação da licença-maternidade por mais 60 dias, visto que não se reveste de natureza de benefício previdenciário por não ser custeada pela Previdência Social e possuir contornos legais próprios que são distintos do salário-maternidade e, portanto, alheios à decisão preferida no RE nº 576.967//PR e no Tema nº 72 de repercussão geral do STF”. A RFB entende que o salário-maternidade se enquadra em um benefício previdenciário, ao contrário da remuneração, que é paga durante a prorrogação da licença.
Nota-se, portanto, que o entendimento da RFB destoa integralmente não só do posicionamento do STF, mas também do que já opinou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) quando da edição do Parecer SEI nº 18.361/2020 e de pronunciamento anterior emitido pela própria COSIT (Solução de Consulta nº 127/2021), que adotou o decidido pelo STF. Ademais, trata-se de verdadeiro desestímulo aos empregadores que já sofrem com uma excessiva carga tributária, bem como de retrocesso a importante prática da equidade de gênero no mercado de trabalho brasileiro, sendo certo que ambos cenários que não podem ser afetados.
Nossa equipe tributária está à disposição para eventuais esclarecimentos e para qualquer apoio necessário.
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