A possibilidade de se dividir em subclasses os credores da Recuperação Judicial


De acordo com a Lei Federal 11.101/05, quando do requerimento de Recuperação Judicial por parte de uma sociedade empresária, seus credores são divididos em classes, de acordo com a natureza de seus créditos.

Ademais,
tal divisão se faz necessária para efeitos de participação e voto na
assembleia-geral de credores, que definirá a aprovação do Plano de Recuperação
Judicial, a escolha do Comitê de Credores, eventual pedido de desistência de
algum devedor, nomeará o gestor judicial e qualquer outra matéria que possa
interferir ou afetar os interesses dos credores [1].

Na
forma da legislação acima citada, a Assembleia-geral de Credores será composta
pelas seguintes classes de credores, conforme o artigo 41:

 Art.
41. A assembleia-geral será composta pelas seguintes classes de credores:

I –
titulares de créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de
acidentes de trabalho;

             II
– titulares de créditos com garantia real;

 III – titulares de créditos
quirografários, com privilégio especial, com privilégio geral ou subordinados.

IV – titulares de créditos enquadrados
como microempresa ou empresa de pequeno porte
.

Estas
são, portanto, as classes de credores previstas em lei. Entretanto, e por
particularidades existentes em cada Recuperação Judicial, alguns credores da
mesma classe podem apresentar interesses homogêneos entre si, mas não comuns a
todos aqueles integrantes da referida classe, ou ainda ser diferenciados pela
sua relevância no próprio funcionamento da empresa recuperanda, possibilitando
inclusive a própria recuperação.

Entretanto,
seja qual for o critério utilizado, é necessário que este se apresente de forma
objetiva, e seja aprovado diante da assembleia-geral de credores, cujo
resultado, se não eivado de nulidade, é soberano. E, ainda, que todos os
credores de uma determinada classe tenham tratamento igualitário, desde que
tenham interesses homogêneos [2].

Neste
sentido, o Superior Tribunal de Justiça enfrentou a questão acima proposta,
através do julgamento do Recurso Especial n.º 1.634.844/SP, distribuído para a
Terceira Turma, e cuja relatoria coube ao Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

Em sua
decisão, acompanhada por unanimidade pelos demais integrantes da Terceira Turma
do Superior Tribunal de Justiça, o Ministro Villas Bôas Cueva salienou
que “em regra, a deliberação da assembleia de credores é soberana,
reconhecendo-se aos credores, diante da apresentação de laudo
econômico-financeiro e de demonstrativos e pareceres acerca da viabilidade da
empresa, o poder 
de decidir pela conveniência de se submeter
ao plano de recuperação judicial ou pela realização do ativo com a decretação
da quebra, o que decorre da rejeição da proposta.”

O
Ministro desenvolve seu voto salientando que mesmo dentro de uma classe de
credores como a quirografária, podem haver credores financeiros, fornecedores
em geral, fornecedores dos quais depende a continuidade da atividade econômica
da recuperanda, credores eventuais, entre outros.

Assim,
no caso em comento, asseverou o Ministro Villas Bôas Cueva que “escolhido um critério, todos os credores que possuam
interesses homogêneos serão agrupados sob essa subclasse, devendo ficar
expresso o motivo pelo qual o tratamento diferenciado desse grupo se justifica
e favorece a recuperação judicial, possibilitando o controle acerca da
legalidade do parâmetro estabelecido
”.

Por fim, o Ministro concluiu que “…é
possível a criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial,
desde que estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de
recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando
vedada a anulação de direitos de eventuais credores isolados”.

Com
esse entendimento, acreditamos que o Superior Tribunal de Justiça possa dar
ainda mais força a determinados credores quirografários que, ainda que
pertencente a uma única classe de credores, podem apresentar interesses
diversos daqueles pela peculiaridade de suas atividades, inclusive para a
efetiva recuperação da empresa recuperanda.

Mas,
como ressaltou o Ministro Relator, a objetividade na escolha do critério para a
criação da subclasse é requisito essencial para a sua validade, uma vez que eventual
critério objetivo poderia causar dúvidas e dar margem à interpretação,
culminando com a violação do tratamento igualitário que deve nortear o
procedimento de recuperação judicial.


[1] Art.
35. A assembléia-geral de credores terá por atribuições deliberar sobre:

       
I – na recuperação judicial:

       
a) aprovação, rejeição ou modificação do plano de recuperação judicial
apresentado pelo devedor;

       
b) a constituição do Comitê de Credores, a escolha de seus membros e sua
substituição;

       
c) (VETADO)

       
d) o pedido de desistência do devedor, nos termos do § 4o do
art. 52 desta Lei;

       
e) o nome do gestor judicial, quando do afastamento do devedor;

       
f) qualquer outra matéria que possa afetar os interesses dos credores;

[2] “O plano de recuperação judicial
deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores
que possuem interesses homogêneos, sejam estes delineados em função da natureza
do crédito, da importância do crédito ou e outro critério de similitude
justificado pelo proponente do plano homologado pelo magistrado.”
 Enunciado
nº 57 da I Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal