A possibilidade da empresa em recuperação judicial participar de licitações sem apresentar certidões negativas


Muito se discute acerca da possibilidade ou não da empresa em recuperação judicial participar de licitações, tendo em vista que não dispõe, em regra, de certidão negativa exigida por Lei e pelos editais dos certames, essencial para que possam contratar com o Poder Público.

 

A Lei de Licitações prevê expressamente, em seu artigo 31, II [1], que constitui documentação essencial a Certidão de Falências para que a empresa possa participar da licitação. E não só esta, mas também as certidões negativas fiscais, por vezes são barreiras encontradas pelas empresas em recuperação judicial para a participação em licitações e consequente contratação com a administração pública.

 

Tal exigência tem fundamento ao passo que constituiria risco à administração pública a contratação com empresa que não goza de saúde financeira, que poderia, após receber parcelas do contrato, não prestar os serviços contratados ou não entregar os produtos eventualmente adquiridos.

 

Por outro lado, as empresas em recuperação judicial por vezes dependem, por sua própria natureza, da contratação com o Poder Público. A participação no certame torna-se fundamental para, inclusive, haver a própria recuperação da empresa nestas condições.

 

O Superior Tribunal de Justiça, por vezes, analisou esta questão, prestigiando o entendimento de que as certidões representariam óbice à preservação da atividade econômica da empresa em recuperação, ainda mais quando essa atividade constitui-se prioritariamente em prestação de serviços ou fornecimento de produtos por contratos com o Poder Público.

 

Recentemente, o Presidente do Superior Tribunal de Justiça [2], atendendo pedido de empresa de telefonia em recuperação judicial, em procedimento de Suspensão de Segurança, sustou os efeitos de decisão do Tribunal Regional Federal local que, em sede de Mandado de Segurança, havia impedido a participação da empresa recuperanda em certame licitatório.

 

Em sua decisão, o Ministro João Otávio Noronha ressaltou que ainda que exista dúvida sobre o valor do dano à ordem econômica decorrente da decisão impugnada, o fato é que ele existe, pois a suspensão da decisão do juízo falimentar compromete diretamente o exercício das atividades desempenhadas pelas requerentes”.

 

Em seguida, o Ministro ponderou que a decisão do Tribunal Regional Federal local “afeta o interesse público e gera grave lesão à ordem e à economia públicas, pois foram comprovados pelas requerentes, de forma efetiva e concreta, os impactos para a continuidade do serviço público de telecomunicações por elas prestado.”
De fato, tem-se que a posição assumida pelo Superior Tribunal de Justiça encontra-se acertada, uma vez que a recuperação tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, permitindo-lhe a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores. Desta forma, pode-se preservar a empresa, a sua função social e o estímulo à atividade econômica, essencial em nosso país.

 

Vale ressaltar, entretanto, que a posição acima deve envolver uma empresa economicamente viável, com reais condições de recuperar-se e cumprir, por certo, com todos os pontos referidos acima, devendo o magistrado analisar o caso concreto e, caso estejam presentes essas condições, permitir a participação da empresa recuperanda em licitações.

 


 

[1] Art. 31.  A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:

II – certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física;

 

[2] Suspensão de Segurança 3048